“Assim, já não sou eu quem vive, mas Cristo que vive em mim” (Gl 2,20)

Reflexão Litúrgica: Sexta-feira, 06/05/2022,
III Semana da Páscoa

Na Liturgia desta sexta-feira da III Semana do Tempo Pascal, vemos, na 1a Leitura (At 9,1-20), que o evangelista Lucas, narrando a conversão de Saulo, quer descrever-lhe a vocação apostólica, mais que a conversão pessoal. No caminho, Saulo é chamado pelo próprio Jesus, cujo Espírito transforma o violento perseguidor em apóstolo corajoso. O texto identifica a pessoa de Jesus morto e ressuscitado com a vida e o testemunho das comunidades que Saulo persegue: “Por que você me persegue?” Saulo é chamado à conversão e à missão pelo Jesus que está vivo na comunidade. Esse processo de conversão coloca a Igreja toda representada pelo discípulo Ananias que diante de uma proposta terá de viver o mandamento da reconciliação e do perdão, acolhendo o antigo perseguidor. Trata-se, portanto, de dupla conversão: de Saulo para a comunidade, e da comunidade para Saulo. O chamado de Cristo deve ser ratificado pela Igreja. Cristo manda Saulo à Igreja, por Ananias, que o batiza e lhe ‘abre os olhos’

A palavra do Senhor mostra o programa da missão de Saulo: vai ser apóstolo entre os pagãos, e seu testemunho lhe provocará muito sofrimento. A história da salvação continua agora na vida dos cristãos, Paulo é porta voz dessa vivência: “Fui crucificado com Cristo. Assim, já não sou eu quem vive, mas Cristo que vive em mim” (Gl 2,20).

No Evangelho (Jo 6,52-59), vemos que quem quiser possuir a vida eterna tem a necessidade absoluta de comer e beber Jesus. Os termos ‘carne e sangue’ indicam toda a pessoa na sua fraqueza e passibilidade e servem, por isso, para fazer compreender que esse comer e beber significa unir-se, por meio do sinal sacramental, à paixão e morte de Jesus; significa entrar em seu mistério para receber e dar a vida. Fortificada, desta maneira, com Jesus, Palavra de Deus feita carne, a comunidade pode comprometer-se com a vida que ele veio trazer ao mundo.

Para entender a Eucaristia, é essencial partir dos sinais escolhidos por Jesus: o pão (carne) e o vinho (sangue): o pão é sinal de alimento, de comunhão entre aqueles que o comem juntos; por meio dele, chega ao altar e é santificado todo o trabalho humano. O vinho, sangue, evoca, em primeiro lugar, todo o sofrimento que existe no mundo. Se, portanto, no sinal do pão, chega ao altar o trabalho do homem, no sinal do vinho, chega aí também toda a dor humana; chega para ser santificada e receber um sentido e uma esperança de resgate, graças ao sangue do Cordeiro imaculado, ao que está unido como as gotas de água misturadas com o vinho no cálice. “O vinho é considerado bebida nobre. Assim como a água se mistura ao vinho e toma gosto de vinho, é assumida pelo vinho, assim pela Eucaristia também nós somos assumidos por Cristo, somos transformados em Cristo. Nessa perspectiva importa que nos deixemos dignificar por Cristo e em Cristo” (BECKHAUSER, Frei Alberto. A Liturgia da Missa: Teologia e Espiritualidade da Eucaristia. 6ª edição. Petrópolis-RJ, Vozes, 1988, p. 58).

O vinho representa, também, a alegria, a festa; não representa tanto a utilidade (como o pão) quanto o deleite. Não está feito só para beber, mas também para brindar. Jesus multiplica os pães pela necessidade das pessoas, mas, em Caná, multiplica o vinho para a alegria dos comensais. A Escritura diz que “o vinho recria o coração do homem e o pão sustenta seu vigor” (Sl 104,15).

Ao escolher pão e vinho, quis Jesus indicar também a santificação da alegria.

 


Padre Leomar Antonio Montagna é presbítero da Arquidiocese de Maringá, Paraná. Doutorando em Teologia e mestrado em Filosofia, ambos pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR – Câmpus de Curitiba. Foi professor de Teologia na Faculdade Missioneira do Paraná – FAMIPAR – Cascavel, do Curso de Filosofia da PUCPR – Câmpus Maringá. Atualmente é Pároco da Paróquia Nossa Senhora das Graças em Sarandi PR.