Chave de leitura – Marcos 8

Queridos peregrinos, o oitavo capítulo do Evangelho de Marcos, é fundamental para compreendermos a identidade e a missão de Jesus de Nazaré. O mistério do messias é revelado pelo autor sagrado de forma muito rica. Por isso, é precisamos nos ater aos detalhes das palavras e ações de Jesus.

O texto pode ser organizado de várias formas, mas adotaremos a estrutura proposta pela Bíblia de Jerusalém.

a) A segunda multiplicação dos pães (Mc 8, 1-10)

Jesus é movido por compaixão. Essa afirmativa nos revela o sentimento de Deus pelo seu povo. Ele não é indiferente nem está alheio aos seus problemas, mas conhece a história, os anseios e as pelejas de sua gente. Jesus está na terra pagã da Decápole. Isso torna sua sensibilidade mais significativa. O amor de Deus e o seu Reino é para todos. A multiplicação é sinal da fartura, da abundância e da plenitude do Reino de Deus. Jesus não alimentou a multidão do nada, mas a partir dos sete pães apresentados pelos discípulos. Quando partilhamos o dom de nossas vidas, Deus o multiplica com sua graça e o Reino acontece. O messianismo de Jesus vem inaugurar um novo tempo na história. No entanto, para participarmos da plenitude do Reino de Deus, precisamos ser generosos de coração. Cada gesto de amor, solidariedade e partilha é uma grande ação de graças por meu da qual Deus age e transforma o mundo.

b) Os fariseus pedem um sinal do céu (Mc 8, 11-13) 

Os fariseus não se contentam com os sinais de Jesus. Eles querem um sinal espetacular. No entanto, o messianismo de Jesus não é um messianismo triunfalista. Ele se realiza através da entrega e da doação. Qualquer sinal que não expresse isso, seria uma traição à sua missão. Fechados em si mesmos, os fariseus não percebiam essa novidade. Por isso, as ações de Jesus de nada valiam para eles.

 c) O fermento dos fariseus e de Herodes (Mc 8, 14-21) 

Jesus se aproveita da preocupação dos seus discípulos para falar da oposição ao seu messianismo. Os fariseus e herodianos não aceitam a novidade de Jesus e querem destruí-la a todo custo. (cf. Mc 3,6) Os discípulos não podem se fixar na superfície do gesto do Mestre. Caso o contrário, não conseguirão enxergar a pessoa que está por trás dos milagres. Não se trata apenas da satisfação duma necessidade material, mas da grande transformação operada pela ação de Jesus.

d) A cura do cego de Betsaida (Mc 8, 22-26)

Depois de insinuar a cegueira dos discípulos, Jesus cura um cego. O processo é lento. Ele realiza o milagre em dois momentos. Isso não tem nada haver com a gravidade do caso ou com a capacidade de Jesus. É mais um sinal profético do Mestre. Os discípulos ainda não tinham enxergado o Mestre. A fé deles estava ofuscada. Não era clara. Eles ainda tinham uma visão turva de Jesus. Através desse gesto, Jesus revela a dimensão libertadora da sua ação que derruba toda e qualquer trava que impede o ser humano de enxergar com clareza, de ver o mundo em toda a sua verdade e compreender a proposta de Jesus.

e) A profissão de fé de Pedro (Mc 8, 27-30)

A palavra Cristo significa “ungido”. Ela resume toda a missão de Jesus. Ele é o Ungido de Deus, isto é, a presença libertadora do Deus de Israel junto ao seu povo. Mas, é precioso fazer silêncio. O encontro com o Mestre é uma experiência pessoal. Ninguém pode crer e se comprometer pelo outro. O compromisso com o projeto libertador de Jesus é pessoal e voluntário.

f) O primeiro anúncio da Paixão (Mc 8, 31-33)

A missão de Jesus é conflituosa. Ele tem consciência de que muitos sofrimentos lhe aguardam. Nesta passagem das Sagradas Escrituras, também encontramos quem são os adversários de Jesus. Trata-se dos anciãos, os sumos sacerdotes e os mestres da lei. Eles se vêm ameaçados pelo Projeto de Deus. Por isso, não querem reconhecer a verdade diante de si. Estão presos às suas próprias convicções e subordinados aos seus interesses pessoais.

g) Condições para seguir Jesus (Mc 8, 34-38)

Jesus apresenta três condições para se tornar seu discípulos. Renunciar a si mesmo, tomar a cruz e seguir. O verdadeiros discípulo missionário do Cristo Jesus, deve renunciar todo o seu interesse, vontade e querer para fazer unicamente a vontade de Deus; deve assumir os sacrifícios e sofrimentos de cada dia, as incompreensões e o cansaço da missão; deve trilhar os passos do Mestre, fazendo da sua Palavra seu grande ideal de vida.

O capítulo 8 do Evangelho de Marcos nos revela o mistério da personalidade de Jesus e aponta algumas diretrizes do seu movimento messiânico. Trata-te de um capítulo provocador. As palavras de Jesus também são dirigidas a nós e devem nos confrontar. Quem é Jesus para nós? Como compreendemos sua mensagem o seu projeto de vida? Quais obstáculos nos impedem de seguir Jesus? Eis uma boa forma de avaliarmos a nossa caminhada de fé! É preciso tomar cuidado para não pintarmos uma falsa imagem de Deus e seguirmos um Cristo inventado ou assumido em nosso imaginário unicamente para corresponder às nossas perspectivas e satisfazer as nossas vontades.