Conhecendo a História por dentro

Estamos na quarta-feira (17), mas a minha cabeça ainda está no dia anterior. No dia de ontem, no ano de 1910, nascia uma das nossas maiores escritoras. Raquel de Queirós nasceu em Fortaleza (CE). Foi a primeira mulher a ocupar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras, em 1977, sucedendo a Cândido Motta Filho. Em 1917, fugindo da seca do Nordeste, veio para o Rio de Janeiro, em companhia dos pais. Cenário este que serviu como motivação para a publicação de “O Quinze”, seu livro de estréia. Devorei esta grande obra, incentivado pela professora Zilda, nos primeiros anos de seminário.

Mas o que desejo conversar mesmo hoje é sobre a “Semana da Consciência Negra”, que inicia no dia de hoje, indo até o dia 20 próximo. Um dos cartazes que tratam desta semana, trás como tema para reflexão a frase: “Humanizar em uma perspectiva quilombola.” Em sendo eu a escolher a temática, para se pensar nesta semana, mudaria esta frase para: “Humanizar em uma perspectiva dos valores da ancestralidade afro descendente.” Sim porque a riqueza cultural, advinda desta ancestralidade, é de fundamental importância para conhecermos a fundo a afro descendência.

A história do processo de escravização do Brasil é mal contada. Não nos trás a verdade de tudo o que ocorreu, nestas paginas obscuras de nossa história. Para começo de conversa, gosto do conceito trabalhado por Laurentino Gomes, que usa a terminologia “ESCRAVIZAÇÃO” e não ESCRAVOS. Esta simples mudança de termos, já nos dá uma dimensão diferente, posto que o afro descendente, foi escravizado e não trazia em sua essência vital a escravidão, como a história nos faz ver. Arrancados a força de suas comunidades/origens e trazidos para os trabalhos forçados além mar.

Este doloroso processo de escravização do povo negro tinha como justificativa à época, as teorias cientificas que afirmavam que o negro era de uma raça inferior e por este motivo poderiam ser escravizados por brancos europeus. Este processo histórico vai até o ano de 1888 entre nós, quando então, segundo relatos históricos, foram salvos pela Princesa Isabel, através da Lei Áurea. Também uma outra farsa bem montada pela historiografia, uma vez que a escravização em nosso país, só vai ter um fim, graças a pressão da Inglaterra, posto que estava, em franca expansão com a Revolução Industrial, precisando assim de mercado consumidor de seus produtos.

A partir de 1888, cinquenta anos depois que a maioria dos países, haviam acabando com este processo, o Brasil põe fim a escravização oficial. Se antes os negros escravizados tinham teto e comida, a partir de então, são jogados no olho da rua. E ainda criam um novo decreto, durante o governo de Floriano Peixoto (Decreto-Lei n. 145, de 11 de julho de 1893), que permitia as autoridades da época, prender os “vadios”, “vagabundos” e “capoeiras” que fossem encontrados na Capital Federal.

O Brasil é tido como um dos países mais racistas, apesar de ter a segunda maior população negra do mundo. Só ficamos atrás da Nigéria. Somos uma sociedade que vive os reflexos da Casa Grande ainda hoje entre nós. O racismo, além de ser algo estrutural, está também institucionalizado. Quem não se lembra que até um tempo atrás, quando as empresas precisassem contratar alguns profissionais, colocavam anúncios nos jornais da seguinte forma: “Precisa-se de pessoas de boa aparência…” Este “boa aparência” significava que não havia chance alguma da pessoa de pele escura ser contratada para a tal vaga.

Precisamos desconstruir muitos dos conceitos que ainda utilizamos entre nós. É necessário desenvolver em nós um processo de descolonização das ideias que a historiografia nos passou em forma de herança colonial. Conceitos estes que ainda mostram o quanto somos preconceituosos e racistas. A nossa própria linguagem nos trai. E ainda assim, sustentamos o “Mito da Democracia Racial”. Segundo esta concepção, vivemos num estado de plena igualdade entre as pessoas, independentemente de raça, cor ou etnia. Este mito ignora que há um abismo imenso entre brancos e negros no país, que segrega populações negras, indígenas, quilombolas, ribeirinhos, favelados. Isto evidencia mais do que nunca que não vivemos esta tal de democracia racial. Sugiro que assistam ao filme “AMISTAD”, que aqui posto apenas o link do trailer