Ontem (06), foi mais um dia daqueles. Cansativo como que! Ainda tivemos que continuar desmentindo as notícias falsas, disseminadas nas redes digitais, anunciando a morte do nosso guerreiro Pedro. Todavia, com um quadro clínico estável, nosso bispo emérito, segue internado numa unidade de terapia intensiva (UTI) da Santa Casa de Batatais (SP), para onde fora transferido na noite desta última quarta-feira (5). Passou por exames especializados e segue o tratamento a base de antibióticos e alimentação via sonda.
Entrei em contato com algumas lideranças do Povo Yawalapiti, para saber como as coisas estavam indo por lá. Revolta, indignação e muita tristeza expressadas em cada fala. Não se conformam com a morte de uma de suas principais lideranças, que cativava e se deixava cativar. Um homem íntegro. Um guerreiro lutador, em todos os sentidos. Conheci Aritana lá pelos idos de 1998. Passando por São Félix do Araguaia, chamava a atenção pelo seu porte físico avantajado e sua pintura corporal extremamente expressiva. Apesar de toda a robustez física, trazia uma fala tranquila e serenidade no seu olhar. Não é para menos que o seu povo está sentindo por demais a sua partida.
Fui dormir tarde e cansado, como tem sido estes últimos dias. Refletindo sobre a fala de um ‘raivoso’ internauta, que descobrira o meu whatsapp, para dizer-me que eu precisaria me converter e aceitar os ensinamentos de Jesus. Que o caminho que eu estava trilhando, iria levar-me ao inferno, como todos os esquerdistas comunistas. Tentei estabelecer um dialogo sereno e respeitosos, mas não logrei resultado, pois percebi que o meu desafeto, não me escutava em momento algum. Desisti. Não sei por que me veio à mente esta narrativa de Mateus: “Não dêem o que é sagrado aos cães, nem atirem suas pérolas aos porcos; caso contrário, estes as pisarão e, aqueles, voltando-se contra vocês, os despedaçarão.” (Mt 7, 6)
Fracassei na minha forma de dialogar com aquela pessoa. A todo instante, estava eu querendo lhe dizer que, de fato, ele tinha razão, quanto a minha conversão. Mais do que ninguém sei o quanto preciso me converter. A conversão faz parte da vida do cristão. Infeliz daquele que entende que não precisa de conversão no seu dia a dia. Sofre e faz também os outros sofrerem. Entendo a conversão não somente como uma mudança de comportamento, mas como algo que vai além do comportamento: trata-se de uma mudança em nossa própria natureza.
Conversão é um processo, e nunca será um acontecimento isolado. Uma mudança radical de pensar e viver. Requer de cada um de nós uma “Metanoia” que significa um processo permanente e crescente que se inicia a partir do momento em que a pessoa reconhece e se propõe a seguir os ensinamentos de Jesus e seus seguidores. Imbuídos dos valores evangélicos, significa assumir o compromisso de lutar para que o Reino de Deus seja construído entre nós. Isto pressupõe também uma postura radical de engajamento como propósito de seguir as mesmas pegadas deixadas por Jesus. Ser um dos seus consigo. Esta é a minha busca permanente, junto aos povos indígenas aqui do Mato Grosso. Tenho lutado comigo mesmo, para expulsar de dentro de mim, o burguês sínico e acomodado, que insiste em ter o seu lugar nas minhas entranhas.
Converter para viver. Foi o que fiz naquela ruptura de minha vida, há 29 anos. O ano era o de 1991. Fernando Altemeyer Junior era pároco da Igreja de São Mateus, em São Paulo e convidou-me para assistir uma palestra com D. Pedro Casaldáliga, que naquela ocasião estaria falando sobre O desafio de ser Igreja no contexto da Teologia da Libertação. Assim que fui apresentado ao palestrante, recebi o convite para vir trabalhar consigo na Prelazia de São Félix do Araguaia. Um aprendizado que se tornou permanente desde então. De lá par cá venho me esforçando para converter-me a cada dia, sendo uma presença em meio aos povos indígenas. Mais aprendendo que ensinando. Sendo um com eles, lutando pelas suas cusas que não são poucas.
Evidentemente que preciso crescer muito ainda neste compromisso de seguimento do RESSUSCITADO. Cada dia é um dia que vou construindo este processo. De uma coisa tenho certeza: continuarei com o meu pensamento socialista das coisas, como a dos povos indígenas que não tem a preocupação com acumulo da terra para além de um bem coletivo de toda a comunidade. Também sigo com a consciência tranquila de saber que não ajudei a edificar o caos e o genocídio em que se tornou o Brasil, depois que as cores verde/amarela dos patriotas de plantão, tomaram o nosso país de nossas mãos, instaurando o inferno em nossas vidas. Prefiro seguir meu mestre, que segue doente e distante daqui: “Nada possuir, nada carregar, nada pedir, nada calar e, sobretudo, nada matar.” (Pedro Casaldáliga)