Depois de mim

Segunda feira do Batismo do Senhor. Solenidade que encerra o ciclo do Natal. Como no domingo de ontem, celebramos a Solenidade da Epifania, a festa de hoje fica esvaziada pelo fato de acontecer numa segunda feira e, nas nossas comunidades, não há a mesma participação das pessoas como no domingo.

O Batismo de Jesus não é somente um momento cronológico, mas também teológico, já que ele é a porta de entrada do ministério público messiânico de Jesus. É possível que tenha sido um acontecimento histórico, uma vez que os evangelhos, sobretudo os Sinóticos, trazem para nós este registro. Mateus e Marcos narram o batismo de Jesus feito por João Batista. Lucas e João só relatam o batismo sem referência ao precursor, o que não minimiza a importância do batismo d’Ele e a contribuição de João.

Rezei nesta manhã à luz do batismo do Senhor. Lembrei-me de todos os meus batismos, menos o primeiro deles, já que foi realizado na fé dos meus pais. Entretanto, já passei por vários deles ao longo da minha história de vida, sempre à procura do Reino. Um dos mais significativos deles aconteceu quando adentrei o universo indígena e me fiz batizar pela ancestralidade e pelos saberes indígenas. Cheguei para ficar e não consigo sair mais de lá.

“Agora sim, você foi batizado no Mato Grosso!” Esta foi a palavra de consolo dita a mim pelo nosso bispo Pedro, quando fui comunicar-lhe, que eu havia sido infectado pelo mosquito da malária, três meses depois de chegar à Prelazia de São Félix do Araguaia. Batizar é deixar-se invadir pela força transformadora do espírito, e permitir que a ação dele aconteça em nós.

“Tu és o meu Filho amado, em ti ponho meu bem-querer”. (Mc 1,11) Esta foi a Teofania (manifestação de Deus) no batismo de Jesus. Deus, coloca na pessoa do Filho, toda a sua determinação de fazer dele o “Servo de Deus”, sobre o qual o profeta Isaías já havia se referido: “Aqui está o meu servo, que eu sustento; o meu escolhido em quem a minha alma tem prazer. Pus o meu Espírito sobre ele e julgará as nações”. (Is 42,1)

O batismo de Jesus é o início de seu projeto messiânico. Dali em diante, Ele vai aprofundando a sua identificação e o serviço em favor dos sofredores da periferia da Galileia. O “Servo de Deus”, caminhando lado a lado com os descartados. Em Jesus, os evangelhos aplicam a Ele a figura do Servo (Mt 3,17; 12,17-21; 17,5).

“Depois de mim virá alguém mais forte do que eu”. (Mc 1,7) O Batista mais uma vez dando-nos uma lição de humildade e desapego, reconhecendo que ele é apenas aquele que veio preparar o caminho para a chegada de Jesus. Jamais passou pela sua cabeça, colocar-se no lugar d’Ele. Há muito que precisamos aprender com João, sobretudo numa Igreja em que padres, bispos e leigos, numa vaidade sem fim, insistem em se colocarem no lugar dê e não a serviço d’Ele, nas causas dos que mais necessitam, como faz hoje entre nós o padre Júlio Lancellotti.


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.