Comecei o meu dia rezando, numa conversa de pé de orelha com o meu Deus. Há coisas que não entendemos muito bem e, nessas horas, chego junto de Deus. Preciso de respostas. Aliás, todos precisamos de respostas, que venham nos dar um alento em meio a tristeza que estamos passando, e nos aponte um horizonte possível. Algumas coisas são de difícil entendimento, como esta notícia de que mesmo em meio a uma das mais graves crises econômicas mundiais da história, 42 bilionários brasileiros viram suas fortunas crescer US$ 34 bilhões nos meses da pandemia, de acordo com a ONG Oxfam com base em dados do ranking de bilionários da revista “Forbes”. Alguém aí consegue entender isso? Eu não!
Na década de 80, refletíamos exatamente sobre esta situação. Nas celebrações das Comunidades Eclesiais de Base – CEBs, esta era a reflexão que perpassava o nosso imaginário. Dizíamos à época: “Há ricos cada vez mais ricos, à custa de pobres, cada vez mais pobres.” Dona Maria Ferreira, uma das lideranças de uma destas comunidades, não se contentava com esta máxima. Dizia ela: “Há ricos cada vez mais ricos, nas costas de nós pobres, cada vez mais pobres.” Como entender esta lógica perversa, num dos momentos mais difíceis de nossas vidas? Pessoas que estão lucrando com a desgraça alheia?
Ainda bem que do outro lado, há aqueles que ainda sabem ser solidários à dor do outro. Felizmente, os indígenas estão experimentando a partilha de algumas pessoas e instituições, que tem chegado neste momento que mais precisam. Medicamentos, testes rápidos, álcool gel, hipoclorito, máscaras, tem sido as generosas doações que nos chegam a cada momento. O que menos tem chegado é qualquer tipo de manifestação solidárias, destes maiorais que estão se enriquecendo em meio à tragédia.
Gestos solidários afirmativos têm recebido também os bispos católicos que assinaram a “Carta ao Povo de Deus”, com criticas contundente e pertinente, ao desgoverno do atual mandatário da nação. Lembrando que não foi à instituição CNBB, que elaborou a carta, infelizmente. A direção da conferência parece ter guardado o saudoso profetismo numa de suas gavetas institucionais. Uma pena, pois em outros tempos bem mais carrancudos, esta mostrava a sua cara, sem nenhum temor.
Mas as ações e atitudes de amorosidade vão brotando aqui e acolá. Gestos solidários que nos marcam, como a dos “Padres da Caminhada”, que redigiram uma belíssima carta de apoio solidário aos nossos bispos. Uma atitude sem dúvida de muita esperança, para dizer-lhes, que não estão sozinhos no enfrentamento desta realidade tão caótica. Fazemos coro às denúncias dos bispos, e queremos reafirmar o compromisso de lutar pela vida dos pequenos. A morte de pobres inocentes, indígenas, quilombolas, ribeirinhos, favelados, não passarão sem que alguém seja responsabilizado pelos quase 100 mil mortos. O sangue destes inocentes está nas mãos daqueles que nos governam, manchando uma das páginas de nossa história.
Somos pela vida! Somos pelos pequenos e não abrimos mãos disso. Queremos dizer àqueles que, covardemente, tem atacado os bispos pela sua ação profética, que a vida está em primeiro plano. Além do mais, seguimos o Deus de Jesus, que é antes de tudo, amor e apaixonado pelos pequenos e marginalizados. Um Deus que não somente faz questão de caminhar com os pequenos, mas que também se faz UM com eles. Neste sentido, não basta ser uma pessoa boa, ter Deus no coração e rezar, é preciso cuidar da miséria, da pobreza e do sofrimento do outro. A indiferença é um pecado terrível que dói no coração do próprio Deus.
Um Deus que é amor. Não como conceito teórico, mas que se identifica com a causa daqueles que estão sofrendo. Um Deus que nos ama com infinito amor e aconchega os pequenos no seu colo de PAI/MÃE. Como nos diz uma das mais belas páginas do no Testamento que assim nos diz: “Caríssimos, amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus e todo aquele que ama nasceu de Deus e conhece Deus. Quem não ama, não chegou a conhecer Deus, pois Deus é amor. (1Jo 4,7-8) Deus é amor e quem quiser ficar n’ELE e com ELE, tem que ser pelo amor, pela vida.