Fala com sabedoria

Sexta feira da segunda semana da quaresma. No período quaresmal a sexta feira tem uma conotação especial, diferente dos demais dias litúrgicos do ano. Neste dia fazemos a memória do itinerário da morte de Jesus no seu calvário, sendo crucificado. Lembramos assim a chamada Sexta Feira da “Paixão”. Palavra de origem latina, que significa sofrimento, dor, agonia. Desta forma, para os cristãos, a Paixão de Jesus de Nazaré representa a crucificação do Filho de Deus. A crucificação foi praticada desde o sexto século a.C. até por volta do quarto século d.C., quando foi abolida por ordem de Constantino I em 337 d.C. Era um tipo de castigo como pena de morte infringida aos rebeldes que se insurgiam contra o sistema.

Neste ano estamos refletindo especificamente por ocasião da Campanha da Fraternidade a temática: “Fraternidade e Educação”, Com o lema: “Fala com sabedoria, ensina com amor” (Pr 31,26). A educação como foco de nossa discussão, objetivando trazer presente todos os percalços pelos quais passa a educação em nosso país. Educação que é considerada como um peso para os nossos governantes, que a vêem mais como “gasto” do que como “investimento”. Desta forma, a educação que chega às camadas populares de nosso país, é de péssima qualidade, visto que a cada ano, se investe menos na estruturação de nossas escolas e na carreira dos profissionais da educação, sempre vistos como um peso morto de nossa sociedade.

Paulo Freire distinguia dois modelos de educação: a educação bancária e a educação libertadora. Segundo a concepção freiriana, a educação bancária partia do pressuposto que o aluno (educando) nada sabia e o professor (educador) é que detinha todo o saber. O professor era um mero transmissor de conteúdos para um aluno que nada sabia e precisava ser preenchido com estes conteúdos, criando assim uma relação vertical entre o educador e o educando. O Educador, sendo o que possuía todo o saber, é o sujeito da aprendizagem, aquele que deposita o conhecimento. O educando, então, é o objeto que recebe o conhecimento. A educação vista por essa ótica, tem como meta, intencional ou não, a formação de indivíduos passivos e acomodados, não questionadores e submetidos à estrutura do poder vigente.

Diferentemente é a educação libertadora ou problematizadora, cujo processo de ensino-aprendizagem se dá através do dialogo permanente entre educando e educador. Educador e educando aprendendo juntos. A aprendizagem vista como uma pista de mão dupla, posto que o próprio Paulo Freire assim enunciava: “Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”. Aprendente e ensinante problematizando juntos o seu modo próprio de aprender. Nesta dinâmica do aprendizado, tanto o educando quanto o educador, pensam a sua aprendizagem e aprendem a decodificar o mundo. O grande desafio da aprendizagem neste contexto, é ajudar o educando a ler o mundo em que ele vive, com todas as suas mazelas e contradições. Educando e educador aprendendo na amorosidade do ato de aprender.

Dai porque a educação libertadora é tão odiada e perseguida pelas classes dominantes. Ela ajuda os pequenos a desvendar os “mistérios” que se escondem por detrás da estruturação das sociedades capitalistas neo-liberais. O educando passa a entender os porquês da exploração dos grandes sobre os pequenos. Dai a razão pela qual Freire insistia tanto no aspecto de que a “A leitura do mundo precede a leitura da palavra”. O educando aprende a leitura da palavra em consonância com a leitura do mundo, de forma crítica, dentro de seu contexto histórico. Dai o sistema enlouquece com esta possibilidade, de fazer acontecer o processo de ensino-aprendizagem uma vez que: “O sistema não teme o pobre que tem fome. Teme o pobre que sabe pensar”. (Pedro Demo)

Educação que se faz através do processo do conhecimento. Educação como prática de liberdade do livre pensar. Neste sentido, o conhecimento se converte numa arma poderosa de transformação e libertação. Uma educação humanizadora, que nos faz interagir com as demais pessoas, num mesmo plano de igualdade, até porque não existe saber mais ou saber menos, mas saberes diferentes, que se completam num todo diversificado. Pensar com o nosso pensamento próprio e buscar o conhecimento como forma de fugir da alienação e do saber pensado pelos meios de comunicação. Somos capazes de produzir o nosso próprio pensamento. Precisamos acreditar mais na nossa capacidade intelectiva de pensar com a cabeça que temos. Como dizia o Neville Goddard (1905-1972): “Sua opinião sobre você é seu ponto de vista mais importante. Você é infinitamente melhor do que pensa que é”. Livre pensar é só pensar! Pensar libertando das amarras da opressão. Captou?

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.