Amanheci hoje com a cabeça em minha terra natal. Lá, em dias como o de hoje, acontece a tradicional e animada festa de Reis, quando as folias de toda a região, vão até a igreja e fazem lindas apresentações. Cresci participando desta linda festa. O meu pai fazia questão que uma destas folias, passasse pela nossa casa, antes desta festa. Ficávamos todos ali, na maior expectativa para ver a folia do seu Tião Leite, que chegava sempre de madrugada. Acordávamos com os acordes da rabeca à porta de nossa casa. Festa de Santos Reis, quanta saudade! Festa muito popular.
O ano já vai adentrando e nós, indo para dentro dele. Sempre nas passagens do ano, fazemos toda uma liturgia, para desejar aos amigos, familiares, vizinhos uma “boa entrada de ano”. O “Feliz Ano Novo” está presente em todas as nossas mensagens. Antigamente, mandávamos Cartões de Natal, às pessoas mais queridas. Hoje, esta pratica não existe mais. Sempre com mensagens bonitas e eloqüentes, desejamos que as pessoas tenham um Ano Novo, repleto de boas vibrações e realizações mil. Tudo isso não passa de boas intenções, o que nos faz lembrar da frase de autor desconhecido: “De boas intenções, o inferno está cheio”.
Entretanto, basta o ano iniciar, para vermos que nada será diferente do ano anterior. Seguiremos na mesmice de sempre, porque as pessoas apenas ficam no plano do desejo, sendo que as suas atitudes práticas permanecem as mesmas de sempre. Mudamos de ano, mas não mudamos de vida e de atitude. A diferença agora está em que 366 dias se foram e outros 365, teremos pela frente para viver a nossa vidinha. Mesmo numa pandemia que exige de nós mudanças drásticas, nada mudará, para que possamos enfrentar a crise sanitária, conforme o protocolo nos exige.
A vida segue o seu transcurso “normal”. Queremos viver! Este é o sentimento comum de todos. Ninguém quer ser abraçado na esquina por um vírus que não está para brincadeiras. Mesmo com as 198.974 mortes (1.242 novas mortes nas últimas 24 horas), as pessoas seguem vivendo como se nada disso estivesse acontecendo. Sem máscaras e promovendo cada vez mais aglomerações. Alguma coisa não vai bem entre nós, pois banalizamos as orientações daqueles que detém as informações e, consequentemente, do perigo que todos estamos correndo.
Só Jesus na causa, costuma dizer o meu amigo Renato. Só Jesus mesmo! Aliás, nem ELE. O Projeto que ELE veio trazer é um projeto fracassado. Do ponto de vista do ”se dar bem e ser bem sucedido”, preconizado pela nossa sociedade, Jesus se deu muito mal. Não soube nem escolher as pessoas que iriam seguí-lo, uma vez que, um deles o traiu, o outro o negou e outro ainda disse que só acreditaria se visse com seus próprios olhos. A sorte de Jesus foram as mulheres que o acompanharam, pois elas, não negaram fogo. Enquanto os homens estavam morrendo de medo, quando da morte d’ELE, elas arregaçaram as mangas, foram ainda muito cedo, ver onde os torturadores haviam colocado o corpo de seu Mestre. Não era atoa que Jesus tivesse um carinho especial por elas, numa sociedade em que o patriarcado machista predominava, relegando as mulheres a seres de segunda categoria.
O texto do Evangelho de hoje (Lc 4,14-22a) nos fala que “a fama de Jesus espalhava-se por toda a redondeza”. (Lc 4, 14) E não era uma boa fama. Pelo contrário, ELE estava cada dia mais envolvido com uma gentalha: prostitutas, adúlteros, cobradores de impostos, publicanos, aleijados, doentes. ELE estava com os pobres, com os desvalidos, com os enxotados por uma sociedade dividida em classes. Só a ralé mesmo. E ELE ali no meio deles. As autoridades da época trataram logo de divulgar este seu envolvimento com essa ralé. Para quem se dizia enviado por Deus, estava se metendo numa tremenda de uma enrascada.
A fama de Jesus se espalhou como rastilho de pólvora. O seu envolvimento com o público que o cercava, trouxe-lhe sérias consequências. Como nos assegura o padre Benedito Ferraro: “Este espanto e este escândalo, aos poucos, se operacionalizam e se transformam em perseguição. A prática de Jesus e de seu grupo sugere uma nova maneira de interpretar a vida, a vida dos pobres, a Lei e consequentemente o próprio Deus. Isso acarretou-lhe inúmeros ataques e perseguições e, no final do processo, a própria condenação. A prática de Jesus, como causadora e reveladora de conflitos, está bem relatada pelos sinóticos nas controvérsias com os dirigentes do povo” (Revista Vida Pastoral – Nº 117)