Quarta feira da primeira semana do tempo comum. O mês de janeiro vai dando as cartas. Vamos caminhando e construindo a nossa história, por mais que alguns dos nossos, não se percebam assim inseridos neste processo, onde cada um é importante para o todo. Este todo é a constituição de cada parte. É nesta diversidade das especificidades que vamos construindo o todo. A experiência do arco Iris nos serve de balizamento. As várias cores dele promovem um espetáculo de rara beleza, onde a “multiformidade” estabelece um todo sincrônico. Impossível olhar para ele e não ver a presença amorosa de Deus.
Uma quarta feira onde a tristeza toma conta dos habitantes mais sensatos deste Planeta Terra. Ainda repercute em nossas veias a indignação pelo assassinato da família ambientalista de nossos vizinhos aqui na cidade de São Félix do Xingu/PA. O pai, José Gomes, conhecido como ”Zé do Lago”, sua esposa, Márcia Nunes Lisboa, e a filha do casal, Joane, de apenas 14 anos, foram cruelmente assassinados na casa da família, na ilha da Cachoeira do Mucura, zona rural de São Félix do Xingu, no sul do Pará. Tudo indica ser uma morte encomendada, dada a luta militante da família em defesa desta nossa Casa Comum. Sem dúvida, um pecado ecológico.
Os dias têm sido muito difíceis de serem digeridos, dada a intransigência, a indiferença e a intolerância por parte de algumas pessoas, no seu jeito de viver e pensar o diferente. O outro, que vive, pensa e age diferente não é mais um adversário político, mas um inimigo a ser duramente combatido com as armas do ódio, da intolerância, do preconceito, da intransigência. O anel de tucum, por exemplo, que para mim representa o meu compromisso com a causa indígena, a causa dos empobrecidos e marginalizados, tornou-se o símbolo diabólico do “comunismo” e da “ideologia da Teologia da Libertação”. A que ponto chegamos!
Padres e bispos perdem um tempo precioso, indo às redes sociais, para estigmatizar aqueles que abraçaram, de uma maneira, mais direta a luta pela libertação dos pobres desta terra. Estes dias mesmo estamos acompanhando um dos padres midiáticos falarem horrores acerca dos usuários do anel de tucum, afirmando que estas pessoas fizeram um pacto com o diabo e estão muito distantes da proposta de Jesus. Nosso bispo Pedro ficaria muito triste de saber, pela boca de um de seus colegas do episcopado, que aquele poeta do Araguaia, nada mais era que uma das “viúvas de Karl Marx, pelo fato de trazer em um de seus dedos, o inseparável anel de tucum.
Vivemos num tempo em que somos desafiados a estender não somente o pensamento, a compreensão, as ideias, mas também estender as nossas mãos. Mãos estendidas significam mãos que se abrem para acolher, para cuidar, para acariciar, proteger e bem dizer. As mãos são as ferramentas de nosso coração. Com elas podemos construir pontes e abrir janelas, que nos colocam em sintonia com o outro. Elas são instrumentos de gratuidade e, por meio delas Deus age na história humana. Nossas mãos possuem poder; para construir ou mesmo também para destruir. Como bem nos disse o poeta e dramaturgo inglês William Shakespeare (1564-1616): “Aquilo que pedimos aos céus na maioria das vezes se encontra em nossas mãos”.
Mãos de Jesus estendidas na ternura e misericórdia de Deus! Mãos que trabalham pelo Reino e se abrem para o esperançar do sonho de Deus para os pequenos. É com elas que o evangelista Marcos introduz o evangelho de hoje: “E ele se aproximou, segurou sua mão e ajudou-a a levantar-se. Então, a febre desapareceu; e ela começou a servi-los. (Mc 1, 31). Mãos que vão ao encontro de outras mãos. Mãos que se entrelaçam em cumplicidade e amorosidade. Mãos que confortam e se abrem para um novo viver. Mãos que transmitem calor humano e energia vital. Um gesto que diz mais do que muitas palavras. Mãos que estabelecem uma nova relação e afugentam o isolamento e a solidão.
Eis o grande desafio do cristão seguidor de Jesus de Nazaré hoje. Ser continuador da missão messiânica d’Ele neste mundo requer que sejamos capazes de falar com as nossas mãos. Transmitir através delas o carinho afetuoso de Deus pelos mais necessitados. Mãos que transmitam palavras de amorosidade e esperança, que sejam fontes de bênçãos. Mãos que se abraçam e permitam que os corações possam pulsar num mesmo ritmo compassado da ternura e generosidade próprias do próprio Deus. Mãos que se ofertam e constroem a história no fazer acontecer o Reino aqui e agora.
Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.