Mulheres de luta

Sou um homem de sorte! Nascido de uma prole de 13 irmãos, sou o terceiro da fila. Nascido num berço pobre e humilde aprendi, desde cedo, a valorizar as pequenas coisas da vida e a conviver com o pouco que nos era permitido viver. Não tínhamos regalias, mas também não nos faltava o necessário para viver de forma digna. Pelo fato de viver no meio de tantas mulheres, aprendi também, no berço familiar, a respeitar e valorizar as mulheres, afinal desta prole, 10 eram mulheres.

Tive multas mulheres significantes e significativas em minha vida. A começar de minha mãe dona Arlinda, de quem herdei o Machado. Mulher simples, não frequentou por muito tempo os bancos escolares, mas de uma psicologia peculiar, para lidar com a formação dos seus muitos filhos, preparando-nos para a vida que se descortinava ali à nossa frente. Fez a sua Páscoa muito cedo, mas deixou-nos um legado de valores e princípios, que me acompanham vida afora.

Também foi assim comigo pelos caminhos que trilhei ao longo da vida. Deus foi muito generoso e caprichoso, ao colocar mulheres especiais em minha vida. Estas mulheres foram ensinando-me nos acertos e desacertos da vida. São tantas que não dá para descrever cada uma delas neste curto texto. Deter-me-ei em algumas delas apenas.

Como me esquecer da minha primeira professora, dona Joelha que, ao me alfabetizar, ensinou-me também a trilhar os primeiros passos rumo à poesia. Lembro da primeira poesia que recitei e, passados muitos anos ainda a recito como da primeira vez. Dona Joelha mostrou-me que eu tinha uma mente com relativa facilidade para decorar as coisas. Mais tarde, já nos anos iniciais do seminário, reencontrei esta professora na pessoa da também professora Zilda Augusta Ribeiro, que me pôs em contato com a literatura, me apresentando o mundo fascinante dos caminhos literários.

Os anos foram se passando e eu encontrando grandes mulheres. Uma destas foi a professora, biblista, teóloga feminista e pastora da Igreja Metodista do Brasil, Nancy Cardoso Pereira. Impressionou-me o fato dela alimentar a sua espiritualidade na vida dos pobres, no campesinato, na luta das mulheres pobres e na teologia feminista. Apaixonei pelo seu jeito de ser e ela se tornou, por muito tempo, a inspiração para o meu sacerdócio. Mulher simples e destemida, Nancy trabalhou por 17 anos na Pastoral da Terra no Brasil.

Ao chegar à Prelazia de São Felix do Araguaia, logo me deparei com aquela mulher franzina irrequieta, parceira nas lutas da igreja, onde quer que fosse o campo de ação. Graças ao seu empenho e dedicação, hoje a prelazia tem um ARQUIVO, que serve de referência para muitos que vem à São Felix estudar, o que se passou neste cantinho do Brasil, a partir da chegada de Pedro por aqui. De saber que este arquivo começou com pequenos recortes de jornais que ela caprichosamente recortava e ia juntando. Claro que estou falando de Maria Paula Franceschini, nascida em São Paulo em 1919, filha de um famoso músico ítalo-brasileiro. Aparentemente frágil e delicada, quanto obstinada e perseverante. Pianista, professora de música e religiosa da Congregação das Irmãs de São José de Chambéry.

Ela é apenas uma das mulheres que me chamou a atenção na Prelazia. Haviam muitas outras (Águeda, Inês, Mercedes, Salete, Judite, Jane, Irena…) que, aos poucos foram mostrando-me um jeito novo de ser Igreja, com rosto feminino, com uma teologia feminista de lidar com a problemática local. Desta forma, fui moldando meu jeito de ser sacerdote, no aprendizado com estas mulheres de Fé e pé na caminhada. Sou um homem de sorte, com tantas mulheres especiais a me inspirar.