Então é Natal! O dia tão esperado por todos os cristãos do mundo inteiro. Vivemos o ano inteiro na expectativa da chegada deste dia. O dia em que Deus quis fazer-se menino no meio de nós. Todos alegres e festivos para mais uma festa, em que todos se reúnem em torno da família, renovando os laços de fraternidade, numa vida em que todos se congratulam.
Celebremos então a Festa da Alegria. Mas para isto, precisamos entender melhor o que esta festa quer significar para todos os filhos e filhas de Deus. Jesus se faz presente na fragilidade de uma criança, que nasce num contexto de absolta pobreza. É na simplicidade desta criança, que virá o Deus ternura, cheio de misericórdia, anunciando-nos uma nova perspectiva de vida. Enquanto algumas pessoas dentre nós, querem se tornar deuses e deusas, o Deus verdadeiro se encarna em nossa realidade, através de uma criança pobre e indefesa no seio daquela família pobre de Nazaré.
O mais pessimista entre nós jamais imaginou que fossemos celebrar o Natal num cenário tão adverso como o atual. Um vírus colocou a humanidade de joelhos. Por mais que queiramos, nenhum de nós é capaz de pensar um horizonte próximo, que nos traga maior segurança para nossas vidas e a das pessoas que tanto amamos. É nesta incerteza que estamos celebrando o dia de hoje. Neste contexto cantamos com nosso trovador Zé Vicente: Oh vem Senhor, não tardes mais! Vem saciar nossa sede de paz!
Não devemos desanimar e achar que tudo está perdido. Que a morte terá a primazia sobre a vida. Não! Definitivamente, não! “É durante as fases de maior adversidade que surgem as grandes oportunidades”, nos dirá o monge tibetano Dalai Lama. Estamos sim, vivendo uma grande crise sanitária mundial. Fomos pegos de surpresa, é verdade! Todavia, recorrendo à etimologia da palavra “crise”, percebemos que ela representa uma oportunidade de purificação e de crescimento. Do sânscrito, crise vem de kir ou kri que significa purificar e limpar. Daí advém o “crisol”, elemento químico com o qual limpamos o ouro, e acrisolar, que quer dizer depurar. Assim, a crise representa um processo crítico, de depuração do essencial: só o verdadeiro e substancial permanece, o trivial e acidental desaparece.
Pensar o Natal é pensar a subversão de Deus na história da humanidade. É Deus mesmo que toma a iniciativa, e vem fazer diferente a história humana. Um Deus extremamente subversivo no seu jeito de se fazer um de nós, encarnando na realidade humana. O Natal é esta realidade que chega até nós. Num dos poemas atribuídos a Dom Hélder Câmara, ele assim se refere ao Natal: “Gosto de pensar o Natal como um ato de subversão… – Um menino pobre; – Uma mãe “solteira”; – Um pai “adotivo”; – Quem assiste seu nascimento é a ralé da sociedade (pastores); – É presenteado por gente “de outras religiões” (magos, astrólogos); – A “família” tem que fugir e viram refugiados políticos; – Depois volta e vai viver na periferia…” Somente um dom Hélder para nos trazer de forma tão clara a natividade de Jesus.
Yeshua, (Jesus) vem ser um de nós, um conosco. Na verdade, este é o termo de raiz hebraica, que quer significar: “salvar” ou “salvação”. Muitos estudiosos têm este nome como o nome original de Jesus, o Cristo, o Messias, escrito em hebraico, mesmo que a língua falada por Jesus fosse o aramaico, a língua popular da ralé.
Celebrar o Natal é olhar a realidade que nos cerca e trazê-la mais próxima de nós. Todos os dias uma criança está nascendo entre nós, no mesmo contexto em que nasceu Jesus. Como a daquele jovem casal que vive com o filho de 1 ano e 3 meses em um cômodo improvisado com tábuas e lona em uma ocupação em Aparecida de Goiânia/GO. A mãe, de apenas 19 anos, conta que ela e o marido estão desempregados e têm sobrevivido de doações e de restos de comida que encontram no lixo. Ela foi colocada para fora de casa pelo próprio padrasto que não aceitara a sua gravidez. Como ela mesma disse: “Para uma mãe, dói muito ver o filho chorar com fome”. Dói na mãe e dói naqueles que possuem o mínimo de sensibilidade.
Muitos dentre nós celebraremos o dia de Natal em nossas comunidades no dia de hoje. Voltaremos para as nossas casas com a consciência tranquila e o sentimento de ter cumprido o preceito. Muitos até, na volta para as suas casas, depararão com cenas como a desta jovem mãe, sem ter uma moradia descente para a sua família. Todavia, jamais poderemos ser indiferentes, frente a realidades como estas. Se de fato, acreditamos que o Jesus menino veio trazer-nos uma nova luz como está descrito no Cântico de Zacarias, é Deus mesmo que ilumina a condição do povo, abrindo uma história nova, que se encaminha para a Paz, isto é, a plenitude da vida.
Isto é Natal! Isto é o Deus da vida que se manifesta à toda a humanidade, sendo luz para clarear a nossa existência, libertando-nos do inimigo e do medo que nos atormenta. Como expressou John Lennon na canção “Happy Christmas”: “A very Merry Christmas And a Happy New Year Let’s hope it’s a good one Without any fear” (Um Feliz Natal E um Feliz Ano Novo! Vamos torcer para que seja bom e Sem medo!)