O Deus de Jesus de Nazaré

Quarta feira da Sexta Semana do Tempo Pascal. A liturgia católica segue nos situando no contexto eclesial das celebrações nas nossas comunidades, nos ajudando a fazer um percurso, iluminados pela Palavra e ação de Deus. No contexto planetário, a fase da Lua é minguante e estamos em pleno outono. Lá fora a natureza sabiamente nos ensina, quando as árvores se despem de sua roupagem (folhas), no intuito de fazer o enfrentamento da realidade mais fria e de baixa umidade da estação. Meu quintal está forrado delas.

Rezei desta vez na companhia ilustre de meus visitantes, nos fazendo interligação nesta “Casa Comum”. Se “tudo está interligado”, rezamos juntos, dialogando com o Pai nesta sinodalidade ecumênica, mais escutando que falando. Escutar Deus que se manifesta em cada um dos seres da criação. Para os olhares e pensamentos mais racionais, trata-se de um louco conversando com bichos. Todavia, prefiro pensar com o filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900) ao assim afirmar em um de seus livros (Assim Falava Zaratustra): “Há sempre alguma loucura no amor. Mas há sempre um pouco de razão na loucura”.

Dia 17 de maio. Duas semanas nos separa do final do mês dedicado à Maria. Um dia para lá de significativo nas nossas lutas por outro mundo possível. Hoje é o “Dia Mundial Contra a Homofobia e Transfobia”. Entendendo a Homofobia como a discriminação contra homossexuais e a Transfobia como discriminação contra pessoas transexuais, travestis e transgênero. Ou seja, toda forma de preconceito e discriminação por orientação sexual e identidade de gênero. A data de hoje foi pensada pela Organização Mundial da Saúde, que deixou de considerar a homossexualidade como uma doença e a retirou da Classificação Internacional de Doenças (CID). Assim 17 de maio é comemorado como a grande oportunidade para uma ampla discussão e divulgação de informações acerca da igualdade de gênero. Somos iguais nas diferenças sexuais.

Somos todos e todas filhos e filhas de Deus! O Deus de Jesus de Nazaré. O Deus que não discrimina nenhum dos seus, seja ele quem for. Ao conviver e se misturar com pecadores, pagãos, prostituas, gente da ralé, Jesus nos mostra a verdadeira face deste nosso Deus. Um Deus que não faz acepção de pessoas, mas sai de si e vai ao encontro daqueles que mais necessitam de cuidados. Neste sentido, Jesus foi até mais enfático ao afirmar: “Eu garanto a vocês, os cobradores de impostos e as prostitutas vão entrar antes de vocês no Reino do Céu”. (Mt 21,31)

O Deus dos cristãos é o Deus de Jesus, o Nazareno. O Deus que vem até nós na pessoa de seu Filho muito amado pelo Pai. Esta realidade me trouxe na memória um dos livros que mais me marcou na minha experiência de fé: “O Deus dos Cristãos” (Ed. Vozes-1986), do teólogo chileno Ronaldo Munhoz (1933-2009). Um digno representante da Teologia da Libertação (TL), sacerdote da Congregação dos Sagrados Corações. Nesta sua publicação, Munhoz nos revela a face de um Deus voltado à realidade latino americana, identificando-o com a causa dos empobrecidos deste Continente. A Teologia da Libertação pensando a fé cristã respondendo às perguntas dos aflitos. Ainda bem que nosso bispo Pedro assim pensava: “Enquanto restarem Deus e os pobres, haverá Teologia da Libertação”.

A Teologia da Libertação não morreu como supõe alguns, mas ela continua viva, preocupando-se com os novos pobres do continente, assumindo assim um jeito de fazer a teologia da misericórdia e da compaixão. Uma teologia irmanada com a proposta de Jesus, que a liturgia desta quarta feira assim nos ensina, através do texto do Evangelho do dia (Jo 16,12-15). Jesus e Deus se fazendo eternamente presentes no meio de nós: “Rogarei ao meu Pai e ele há de enviar-vos um outro Paráclito, que há de permanecer eternamente convosco. (Jo 14,16) O Deus de Jesus, de plena amorosidade e compaixão, se fazendo presente em cada um de nós, que através de nosso testemunho, fazemos acontecer a história. Guiados pela força do Espírito, somos capazes de ler e interpretar o mundo a partir da palavra e ação de Jesus. Outro mundo possível sob a ótica do Deus dos pobres.

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.