O escândalo

O escândalo divide, agride e causa indignação. O escândalo está “infiltrado” em todas as dimensões da vida: política, econômica, religiosa, familiar… A vigilância diante dos escândalos é para todos, pois “aquele que julga estar em pé, cuide-se para não cair”. (1Cor 10,12)
O Antigo Testamento expôs alguns escândalos, como a bebedeira de Noé (Gn 9,21), a mentira de Abraão (Gn 20,2) e o adultério de Davi (2Sm 11,1-5). O povo eleito escandalizou Yahweh, com a confecção do bezerro de ouro, a indiferença à aliança, o descaso aos pobres, a perseguição aos profetas, o abuso do poder, pastores mercenários, etc… Jesus, no Novo Testamento, falou do escândalo no sentido original grego “skandalizo”, o que significa conduzir alguém a tropeçar, a pecar e a apostatar da fé, e radicalizou quando disse: “Corta o teu pé e arranca o teu olho se te levarem ao escândalo” (Mt 18, 8-9).
Para prevenir os apóstolos de uma possível apostasia, em razão das perseguições que sofreriam por causa Dele, Jesus declarou explicitamente: “Tenho-vos dito estas coisas para que não vos escandalizeis” (Jo 16,1). Mas também usou o mesmo sentido da palavra para falar da sua pessoa: “Bem-aventurado é aquele que não achar em mim motivo de escândalo” (Mt 11,6), apesar de muitos se escandalizarem (Mt 13,57).
É possível não escandalizar? Jesus afirmou que não é possível, mas culpou e responsabilizou a pessoa que causa o escândalo (Mt 18,7), sobretudo com relação às crianças, “quem escandalizar um desses pequeninos, será melhor amarrar uma pedra de moinho no pescoço e lançar-se ao mar” (Mc 9,42).
O único tipo de escândalo que é justificado por Deus, é aquele que decorre da mensagem de Cristo crucificado, por não se aceitar a ideia de Deus ter morrido numa cruz, por achar nisto motivo de fraqueza e de impotência em Jesus para salvar a Si mesmo (cf. 1Cor 1,23). Mas, o que é escândalo e loucura para muitos, é manifestação do poder de Deus para os crentes (cf. 1Cor 1, 23-24).
A gravidade do escândalo é irreparável, especialmente quando está relacionado à religião, porque atinge a fé, dom precioso concedido por Deus ao fiel. Por outro lado, sem justificar qualquer tipo de escândalo, é preciso levar em conta que o réu é humano e, por isso, frágil e contraditório nas suas escolhas, quase sempre deixando de fazer o bem que deseja e optando pelo mal indesejável (cf. Rm 7,15).
O episódio da adúltera (Jo 8, 3-11) é uma chave de leitura para que não abandonemos a vida de fé, em vista de escândalos, que corrijamos os culpados e exercitemos a misericórdia. Vejamos: uma mulher pecou contrariando a lei mosaica (adultério), escandalizando os que buscavam viver a “pureza” da fé. Há um grupo que a condena e busca fazer justiça com as próprias mãos, usando a lei como justificativa. A solução, para o caso, é dada por Jesus que aplaca a ira dos que a condenam, apontando-lhes o espelho: “Quem de vós não tiver pecado, atire nela a primeira pedra” (v.7), acolhendo a pessoa (mulher): “Eu também não a condeno (v.11) e abominando o seu erro: “Pode ir e não peques mais” (v.11).
Além deste fato, em outros momentos, Jesus nos ensinou a “vencer os escândalos”, afirmando a santidade como ideal que alimenta a fidelidade: “Sede santos porque o vosso Pai do céu é santo” (Mt 5,48). (e) Ele nos apresentou uma metodologia de postura cristã, frente aos escândalos:
1. Não julgar e condenar, quando ainda não há provas e conclusão dos fatos (Lc 6,37).
2. Vencer o espírito de vingança, ódio e sentimentos que são sinônimos de morte (Ex 20,13).
3. Se você não está envolvido e não tem uma uma resposta, não aumente o escândalo (Jo 7,24).
4. A correção na caridade e no respeito faz parte do seguimento do Mestre (Mt 18, 15-20).
5. A justiça de Deus tem parâmetros diferentes da justiça humana (Ez 18,23).
6. É preciso ser misericordioso como o Pai do céu (Lc 6,36).
7. Se houver culpados, esses deverão ser julgados e penalizados pela lei (Mt 22,21).
8. Vale lembrar que, quem errou foi o ser humano e não Deus e a Igreja como Instituição divina. E a nossa fé jamais poderá estar alicerçada em pessoas – “Maldito o homem que confia no homem” (Jr 17,5), mas em Jesus Cristo (2Tm 1,12).
Que o Senhor nos dê a graça da perseverança e da fidelidade no seu santo serviço e a compaixão com os que erram, pois, o julgamento não compete a nós.
Dom Amilton M. da Silva, CP
Bispo Diocesano de Guarapuava – PR