Quarta feira da sexta semana do tempo pascal. Seguimos na nossa trajetória histórica, construindo um dia de cada vez. Cada dia é único, provocando-nos viver o momento presente de forma única, fazendo o melhor que podemos dar de nós. A nossa pressa histórica não acelerará o momento histórico, alertava-nos o filósofo e economista prussiano Karl Marx (1818-1883). Tudo a seu tempo, muito embora com a nossa participação incisiva e decisiva. “Não deixar para o amanhã o que se pode fazer hoje”, diziam-nos nossos avós, com sabedoria e experiência de vida. “Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu”. (Ecle 3,1)
O tempo cronológico é o de 2022 (Kronos). Neste ano a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil nos provoca a refletir sobre a realidade da educação no Brasil, promovendo o diálogo desta realidade à luz da fé cristã. O tema por si só já é desafiante: “Fraternidade e Educação”. O lema, então, nos instiga por demais: “Fala com sabedoria, ensina com amor” (Pr 31, 26). Uma proposta de reflexão que nos leva a adentrar o campo educacional brasileiro para defrontarmos com as suas contradições latentes. Nossa educação vai mal! Muito mal! Não bastassem os baixos índices de investimento e de aprendizagem de nossos alunos, a educação no país não é uma prioridade séria para muitos de nossos governantes. À seu tempo, Darcy Ribeiro já nos advertia: “A crise da educação no Brasil não é uma crise; é um projeto”.
Precisamos retomar a caminhada de luta por uma educação de qualidade social. A proposta da CNBB é interessante, muito embora grande parte da Igreja no Brasil não abraçou esta causa proposta pelo episcopado brasileiro. Os discursos do altar (púlpito) sequer fazem referência à realidade da educação, seja por desconhecimento de causa, seja pela opção por uma homilética pautada nos chavões dogmáticos que mais servem a alienação dos seus ouvintes do que a um envolvimento e comprometimento transformador da realidade educacional. Estamos perdendo assim uma grande oportunidade de fazer o enfrentamento desta realidade, retomando quem sabe o pensamento de Anísio Teixeira (1900-1971), de Darcy Ribeiro (1922-1997) e do próprio Paulo Freire (1921-1997).
“Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor” Parafraseando Paulo Freire, quando a Igreja não é libertadora, o sonho de Deus com o Reino se transforma em pura alienação e não leva à transformação. Uma Igreja assim serve mais aos interesses de uma elite dominante, se afastando por completo da proposta de Jesus de Nazaré e da vivência experiencial das primeiras comunidades primitivas. Mesmo que a proposta da Campanha da Fraternidade da CNBB seja pertinente e profundamente atual, ela não vai adiante, quando se tem uma Igreja que se esconde por detrás de um sacramentalismo doentio desencarnado da realidade.
São muitos os desafios para uma discussão mais séria acerca da educação no Brasil. Poderíamos estar refletindo, por exemplo, sobre a valorização dos profissionais da educação, com a necessidade urgente do pagamento do Piso Salarial Profissional Nacional. A Lei n° 11.738, foi votada em 16 de julho de 2008, instituindo assim o Piso Salarial Profissional Nacional para os profissionais do magistério público da educação básica. Entretanto, apesar de 14 anos da existência desta lei, estados e municípios da federação insistem em descumprir aquilo que está previsto em lei, fragilizando ainda mais a nossa educação. O recurso federal cai nos cofres dos municípios, através do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), mas os gestores não os repassam em forma de um pagamento mais digno dos salarios dos servidores da educação.
Educação como prática de liberdade. Educação como busca da verdade do conhecimento. Educação que nos leva ao livre pensar. Como Jesus mesmo nos orienta hoje, através deste seu longo discurso de despedida: “Quando, porém, vier o Espírito da Verdade, ele vos conduzirá à plena verdade”. (Jo 16,13). Verdade como forma de vida e não como passaporte para a mentira. O espírito da verdade é a porta de entrada do conhecimento. Conhecimento com sabedoria para se fazer o discernimento. Tendo em nós a presença fortalecedora e elucidante do Espírito, somos capazes de “ler o mundo” a partir da palavra e ação de Jesus. Lendo o mundo e discernindo a verdade dissociada da mentira, que insiste em se fazer presente nas ações de seus encantadores de cães presentes no meio de nós. Como já nos dizia Raul Seixas em sua canção: “Eu não posso entender tanta gente aceitando a mentira”. Mentira dita de tantas formas que quer se passar por verdade. A verdade é uma só.
Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.