O messianismo de Jesus

Chegamos ao sábado (20). Mais um final de semana que se prenuncia. Seguimos nós no espírito da quaresma, refletindo sobre a nossa caminhada de igreja, na procura do Reino. No dia de hoje, mais precisamente, às 06:38, iniciamos a estação do outono. O verão nos deixou e agora as arvores sazonais (próprias da estação) trocam suas folhas, preparando-se para a chegada do inverno, que iniciará no final do mês de junho. Segundo os indígenas, as arvores desfazem-se das folhas para enfrentar com resistência uma estação, cheia de dificuldades, que terão pela frente.

Dificuldades estas que são inatas as nossas vidas. Elas estão presentes nas nossas vidas desde quando nascemos. Elas nos são intrínsecas. É através delas que vamos crescendo e amadurecendo e nos realizando enquanto seres humanos. Aqueles e aquelas que não aprendem desde cedo a conviver com elas e administrá-las, deixa de amadurecer e também de crescer e serão eternos infantilizados ao longo da vida. Por este motivo é preciso olhar as dificuldades com esperança e otimismo. Quem sabe fazendo uso de uma das frases do grande estadista britânico Winston Churchill: “O pessimista vê dificuldade em toda a oportunidade. O otimista vê oportunidade em toda a dificuldade.”

Dificuldades estas que também fizeram parte da vida do Jesus Histórico, durante a sua estada na Palestina, sobretudo nos embates com as lideranças religiosas daquele dado momento. Ao tornar público o seu projeto messiânico, as dificuldades aumentaram enormemente. Aquelas lideranças locais, em hipótese alguma, aceitavam ou admitiam que o Messias pudesse vir da Galileia, como está descrito no evangelho deste sábado. “Porventura o Messias virá da Galileia? Não diz a Escritura que o Messias será da descendência de Davi e virá de Belém, povoado de onde era Davi?”. (Jo 7, 41-42)

Esta foi a dificuldade que Jesus precisou administrar no início de sua vida pública. A resistência ao seu messianismo, e aquilo que ele representava como enviado do Pai, provocou nas lideranças religiosas, uma situação embaraçosa, já que o povo se identificou desde o início com a maneira como Jesus se relacionava com os mais pobres. Ou seja, aqueles que estavam no poder não toleravam a mensagem de Jesus, porque ela acabaria com todos os seus privilégios. Por este motivo, amaldiçoam os pobres e já começaram ali a arquitetar um plano para prender Jesus, usando a Lei (Torá) como arma, como pretexto: “Da Galileia não surge profeta” (Jo 7,52) .

Diante deste contexto emblemático apresentado pelo evangelho de hoje nos deparamos com a necessidade que temos de fazer a respeito de uma interpretação correta e mais fidedigna da Palavra de Deus. Não basta ler o texto bíblico e sair por ai vomitando cada um dos versículos lidos. É necessário lê-lo dentro do contexto em que foi escrito e procurar entendê-lo a partir do contexto de época. Aquilo que chamamos de exercício hermenêutico. Não se trata de algo assim tão fácil, mas esta prática nos ajuda a não pinçar o texto fora de seu contexto original. Até porque, um texto fora do contexto se transforma num mero pretexto para justificar os nossos argumentos e as nossas conveniências e interesses. Exatamente como fizeram as autoridades religiosas diante de Jesus à época. Vendo seus privilégios e interesses ameaçados pela proposta messiânica de Jesus, os doutores da lei as interpretam da forma que atendam aos seus interesses afins.

O messianismo de Jesus se identifica com o “Servo sofredor” do qual nos falara o quarto cântico do profeta Isaías (Is 52.13-53.12). Nesta narrativa, o profeta descreve as dificuldades e o sofrimento, a morte e a elevação do “Servo de Javé”. Jesus incorpora este personagem no meio do povo, como o “Servo Sofredor”, identificando o seu messianismo profético com a mesma proposta apresentada pelos profetas do Antigo Testamento (At 8.32-33; cf. Mt 8.17; Lc 22.37; 1Pe 2.24). Numa sinergia perfeita com a realidade de sofrimento do povo da periferia da Galileia.

Quem é este Messias afinal? Quem é esta pessoa que tanto provocou as lideranças religiosas de seu tempo? O que vem a ser esse tal Messias? Se formos observar etimologicamente, tanto a palavra hebraica Mashíahh (Messias) quanto a palavra grega equivalente Khristós (Cristo) significam “Ungido”. Desta maneira, “Jesus, o Cristo” significa “Jesus, o Ungido”, ou “Jesus, o Messias”. O mesmo que no Prólogo do Evangelho de João aparece como “O Verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1, 1-2)

É assim que Deus resolveu fazer morada no meio de nós. Assumiu a nossa condição humana, fazendo o seu Filho ser um de nós, um conosco, em meio à realidade humana com todas as nossas dificuldades. Esse é o mesmo Deus, que não fica distante dos seus, como está resumido sinteticamente numa das orações eucarísticas: «Verdadeiro homem, concebido do Espírito Santo e nascido da Virgem Maria, viveu em tudo a condição humana, menos o pecado, anunciou aos pobres a salvação, aos oprimidos, a liberdade, aos tristes, a alegria» (Oração Eucarística n. 4). Este é o Messias! ELE é o Cara, como dizem os mais jovens. É com ELE que vamos enfrentando as nossas dificuldades que temos. O Messias que é nosso!