O Natal do cuidado

Uma quarta-feira (23) de muita chuva sobre o Araguaia. São Pedro não economizou água durante a noite. O Araguaia agradece! Assim, teremos mais peixes ao longo do ano, afirmam contentes os pescadores, que agora estão cumprindo a piracema em suas casas, tentando receber do governo caloteiro, o auxílio, para que possam esperar o fim da desova dos peixes, e voltarem a exercer suas atribuições pesqueiras.

Enfim vem chegando o Natal. Um Natal diferente de todos os demais. Um Natal “anormal”, já que devemos tomar todos os cuidados, para que não sejamos surpreendidos pelo vírus em nossas famílias. Talvez, mais do que nunca, devamos buscar o verdadeiro sentido do Natal, como a festa do nascimento de Jesus. Natal cujo personagem principal é o Filho de Deus, que vem até nós, e não as nossas “comilanças” egoístas, os nossos sorrisos amarelos, o consumismo desenfreado e o porre anestésico das relações mal trabalhadas e conduzidas.

Um Natal diferente e que nos revestimos de esperança. Esperança que brota da possibilidade de renovação das nossas ações e atitudes perante a vida. Talvez da forma como nos chama a atenção o Papa Francisco: “Estes são sinais de esperança, especialmente nestes tempos difíceis. Tenhamos o cuidado de não nos determos no sinal, mas de ir ao sentido, isto é, a Jesus: ao amor de Deus que Ele nos revelou, de ir à infinita bondade que fez brilhar o mundo. Não há nenhuma pandemia, nenhuma crise que possa extinguir esta luz. Deixemo-la entrar em nossos corações: estendamos nossas mãos àqueles que mais necessitam, assim Deus nascerá de novo em nós e em nosso meio”.

Este é o Natal do cuidado!. Cuidar das coisas de Deus, de nós mesmos e dos filhos seus. Cuidado com a criatura, que ora necessita de uma atenção especial. Cuidar daquele e daquela que mais necessita. Este é o nosso desafio neste “Natal anormal”. Cuidado este, que requer um olhar mais atento e diferenciado para com aqueles que estão à nossa volta. Que não sejamos indiferentes, como aqueles os quais nos alerta Leonardo Boff: “O que se opõe ao descuido e ao descaso é o cuidado. Cuidar é mais que um ato; é uma atitude. Portanto, abrange mais que um momento de atenção. Representa uma atitude de ocupação, preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro”.

Há um “mundo” lá fora, que precisa ser olhado com carinho. Uma realidade não muito distante de nós, que requer o nosso cuidado. Lembrando que “o cuidado entra na natureza e na constituição do ser humano. Sem o cuidado, ele deixa de ser humano. Se não receber cuidado desde o nascimento até a morte, o ser humano desestrutura-se, definha, perde sentido e morre. Se, ao largo da vida, não fizer com cuidado tudo que empreender, acabará por prejudicar a si mesmo e por destruir o que estiver a sua volta. O cuidado deve ser entendido na linha da essência humana”. (Saber Cuidar – Ética do Humano Compaixão pela Terra – Leonardo Boff)

Natal é uma festa tradicional que realizamos a cada ano entre nós. Esperamos ansiosamente por ela. Oportunidade em que a família se reúne, confraterniza entre os seus membros. Momento de reencontro entre as pessoas. Quiçá seja este o momento especial para conhecermos um pouco mais, acerca da missão de Jesus entre nós desde os seus primórdios. Se nos julgamos seguidores d’ELE, precisamos afinar o nosso discurso e a nossa prática com a missão que ELE veio dar cabo entre nós. Nada melhor do que conhecer esta realidade a partir daquilo que está escrito na narrativa bíblica. “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ELE me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar a remissão aos presos e aos cegos a recuperação da vista, para restituir a liberdade aos oprimidos e para proclamar um ano de graça do Senhor.” (LC 4, 18-19)

Este é o espírito que devemos ter diante desta festa tão importante para nós. Jesus vem para proclamar a Boa Notícia da libertação. Os destinatários desta Boa Nova, são os pobres, porque eles estão abertos à fraternidade e à partilha. Para que a libertação se torne uma realidade palpável, devemos buscar a justiça nas relações entre as pessoas. O triunfo da justiça põe por terra as explorações que existem entre nós. Celebrar o natal é estar disposto a lutar pela justiça. Nesta perspectiva, faz sentido a frase dita por Francisco: “O que os pobres precisam não é de caridade, mas de justiça”.

O Natal do cuidado! O outro não pode ser um estranho para mim. Na perspectiva de Deus, somos todos irmãos e pertencentes a grande família de Deus. Cuidar do outro, é antes de tudo, perceber quem sou eu. É através do outro, que comigo habita o mundo, que vejo refletida a imagem de meu eu. O outro não pode ser o inferno para mim, como afirmava o filosofo Frances, Jean Paul Sartre. O outro é meu irmão, minha irmã, carente e necessitado, que precisa ser cuidado por mim. Cuidar do outro, é cuidar de mim! Cuidar do outro e cuidar de mim, é ser cuidado por Deus! Feliz Natal do cuidado!