O perdão como ato pedagógico

Quinta feira da décima nona semana do tempo comum. Festa de Santa Clara (1193- 1253). Amiga e companheira inseparável de São Francisco de Assis. Nascida na cidade de Assis, Itália, pertencente à nobreza, Clara dedicou-se a uma vida austera de profundo respeito aos pequenos, vivendo com Francisco de Assis na pobreza evangélica. Num contexto em que a Igreja flertava com as benesses e regalias da nobreza, Clara deu início a um novo estilo de vida religiosa, fundando a Congregação das Irmãs Clarissas. Através dos votos de pobreza, castidade e obediência e, orientadas por São Francisco, elas adotaram as regras beneditinas e foram viver na extrema pobreza.

Dia 11 de agosto, um marco importante para a educação brasileira. Nesta data se comemora o Dia do Estudante. Uma comemoração que acontece desde o ano de 1927, fazendo referência a um ato instituído pelo Imperador D. Pedro I, que no ano de 1827, autorizou a criação das duas primeiras faculdades de Direito do Brasil: a Faculdade de Direito de Olinda, em Pernambuco, e a Faculdade de Direito do Largo do São Francisco, em São Paulo. Em função da criação destes dois espaços universitários, comemoramos hoje o Dia do estudante e também o Dia do Advogado no Brasil.

Dia 11 de agosto é uma data a ser lembrada também no calendário das nossas lutas. Hoje estamos atentos para o Dia Nacional de Mobilização em defesa da democracia. Em vários locais espalhados pelo Brasil, será lida a Carta pela democracia que já conta com mais de um milhão de assinaturas. Depois da Ditadura Militar (1964-1984), nossa democracia é ainda uma senhora de 38 anos de idade, que precisa continuar a viver, apesar das flagrantes ameaças das forças reacionárias e retrogradas que se instalaram no poder central do país. Estar nas ruas é a forma mais legitima de defender o Estado Democrático de Direito. Como diria Mário Quintana: “Todos esses que aí estão, atravancando meu caminho, eles passarão… Eu passarinho!” Eles passarão! Nossa democracia fica!

“Pai, perdoa-lhes, pois eles não sabem o que fazem” (Lc 23,34) Esta é uma das frases ditas por Jesus no alto da cruz, que todos nós conhecemos. Esta é a frase que também repetimos diante da situação caótica em que estamos vivenciando e, mesmo assim, há um número considerável de pessoas que insistem em não querer ver e ainda apoiam o armamentismo, a prevalência do ódio, da violência, do império da mentira e a dilapidação dos direitos mais básicos, duramente conquistados ao longo de anos de luta. Confesso que do alto destes meus 65 anos de vida, não tivesse ainda que lutar por garantir os princípios básicos da democracia em nosso país.

Perdoar é o verbo da vez que o lecionário litúrgico desta quinta feira nos traz. Mateus nos introduz a cena paradigmática do dialogo de Jesus com o pescador Simão Pedro: “Quantas vezes devo perdoar, se meu irmão pecar contra mim? Até sete vezes? (Mt 18, 21) Ao que o Mestre lhe responde: “Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete”. (Mt 18, 22) O número em si não é importante, pois é meramente simbólico. Na realidade, segundo a lógica de Jesus, o perdão não é assunto de matemática, nem de regras ou leis, mas de atitude, de comportamento, de comprometimento. Comprometer-se com o ato de perdoar sempre, sem limite, infinitamente. Se o espírito de perdão move o coração, uma pessoa estará tão disposta a perdoar sem arrependimento, quantas vezes forem necessárias, pois não é o ato que vale em si, mas o espírito que o motiva. Como o próprio salmista assim nos ensina: “Senhor, se levas em conta as culpas, quem poderá resistir? Mas de ti vem o perdão, e assim infundes respeito”. (Sl 130,3-4)

Perdoar é um ato de amor. Perdoar é o gesto nobre do coração que está repleto de amor. Na compreensão de Jesus o ato de perdoar é um ato pedagógico de quem se entrega na relação, superando inclusive a dinamicidade do rancor, da ira, próprios do desamor. Na comunidade dos seguidores de Jesus não há limites para o perdão. Nem sempre entendemos desta forma a pedagogia e a regra condicionante do perdão instituída por Deus, através da pessoa de Jesus. Aliás, temos grande dificuldade ainda de perdoar as pessoas. Por mais que rezemos com frequência a oração do Pai Nosso e nela está lá de forma explícita: “Perdoai as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido”. (Mt 6,12) Somente um coração despojado, aberto, humilde, acolhedor e cheio de amorosidade é capaz de perdoar sem limites. Humildade que se difere da ingenuidade. Não podemos ser ingênuos nas nossas relações. O amor e o perdão requerem compromisso de libertação. A melhor forma de perdoar o opressor é fazer com que nunca mais oprima. É tirar de suas mãos as armas opressoras. Que santa Clara nos ensine a forma de amar e perdoar sempre sem limites para o perdão!


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.