Terça feira da quarta semana do Advento. Jesus está vindo ao nosso encontro mais uma vez. Ele quer nascer em nosso meio, trazendo-nos a esperança de vida nova que Deus quer para todos e todas. Um Natal diferente daquele proposto pelos interesses capitalistas, que toma conta de alguns dos nossos. Estamos falando do Natal do Menino Jesus, frágil, indefeso, mas cheio de vida e de perspectivas de novos horizontes. A vida que prevalece, apesar de tantos sinais de morte, trazida pelos apologetas do ódio, da indiferença e da omissão.
Uma semana especial, pois a alegria vai tomando conta de nosso coração, de nosso espírito. Celebrar o Natal é estar disposto a encarar os desafios postos, com a presença do Deus que se faz conosco em cada um de nós. A criança que renova os ares é o mesmo Deus que encarna em nossa realidade humana, estando conosco, afinal Ele assim nos garantiu: “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos.” (Mt 28,20) Quem sou eu para dizer o contrário.
Sinais de vida e esperança. Sinais de alegria e tristeza também. No dia de amanhã (22) completam-se 33 anos que Chico Mendes foi barbaramente assassinado. Francisco Alves Mendes Filho (1944-1988), mais conhecido como Chico Mendes, foi um seringueiro e ambientalista brasileiro que assumiu a liderança dos movimentos ativistas da região amazônica na década de 1980. Lutou bravamente a favor dos seringueiros da Bacia Amazônica, cuja subsistência dependia da preservação da floresta em pé e das seringueiras nativas. Chico costumava dizer que, “Os seringueiros, os índios, os ribeirinhos há mais de 100 anos ocupam a floresta. Nunca a ameaçaram. Quem a ameaça são os projetos agropecuários, os grandes madeireiros e as hidrelétricas com suas inundações criminosas”.
Os anos se passaram e a Amazônia segue sendo destruída pela ação criminosa e genocida de garimpeiros, madeireiros, pecuaristas, agronegócio… Segundo dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente e da Amazônia (IMAZON), “a Amazônia Legal perdeu 10.222 km² de floresta entre janeiro e novembro de 2021, o equivalente a sete vezes o tamanho da cidade de São Paulo.” É o maior acumulado dos últimos 10 anos para o período. Apenas neste novembro passado, foram 480 km² desmatados na região, a segunda pior taxa para o mês em dez anos (o recorde foi registrado em 2020, com 484 km²). O que mais nos deixa tristes é de saber que esta tragédia teve nos Estados de Pará e Mato Grosso, seus maiores destruidores do meio ambiente. Tem razão o Papa Francisco quando fala do “pecado ecológico”.
Os indígenas têm uma frase que repetem com frequência: “O que acontecer à terra, acontecerá aos filhos da terra”. Uma sábia profecia que já estamos experimentando os seus resultados. Enquanto não mudarmos a nossa relação com a Mãe Terra, vamos colher os frutos que estamos plantando. “A terra não é um bem de capital”, surpreendeu-me o cacique Damião (Xavante de Marãiwatsédé) tempos atrás, numa de nossas conversas. O nosso olhar para o meio em que vivemos é de superioridade e não de irmandade e interligação. O nosso sonho de consumo é o de possuir a terra, enquanto os indígenas trazem em si a sábia concepção do contrário, são eles que pertencem a terra. Aliás, este é também o entendimento bíblico: “Você comerá seu pão com o suor do seu rosto, até que volte para a terra, pois dela foi tirado. Você é pó, e ao pó voltará”.(Gn 3,19) As relações de fraternidade querida por Deus, transformam-se em relações de poder e opressão; a relação de partilha transforma-se em exploração, e esta produz a riqueza de poucos e a pobreza de muitos.
Como reaver a esperança em dias tão sombrios e tenebrosos? Uma noite escura que estamos vivendo e que demora em chegar à luz do dia. Resta-nos apegarmos ao Deus do impossível, que renova todas as coisas. Pelo menos é o que está nos dizendo o texto do profeta Sofonias na liturgia de hoje: “Não temas, Sião, não te deixes levar pelo desânimo! O Senhor teu Deus está no meio de ti, o valente guerreiro que te salva”. (Sf 3,16-17) Um profeta menor, mas de uma singularidade enorme para a história dos seus, que haviam voltado do exílio na Babilônia e precisavam assim começar o processo de reconstrução de Jerusalém.
É preciso encontrar sinais de esperança entre nós no dia a dia. É preciso construir sinais de esperançamento nas nossas ações cotidianas. Ver a destruição e nos calarmos nos tornam cúmplices das forças da morte. Estando numa das aldeias recentemente, vi ali, convivendo com eles, a onça que havia sido curada das feridas de queimadura em suas patas. Uma situação inusitada para mim, não para eles. É como se o animal estivesse agradecendo pelo fato de ter sido salva do fogo que tomara conta daquela região. Ali eu acreditei mais ainda de que “Tudo está interligado, como se fôssemos um”.
Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.