Estamos iniciando mais uma semana. Temos tudo a favor para nos desesperançar. As notícias que nos chegam não são nada animadoras. Mortes e infecções que se proliferam assustadoramente. No meio indígena então, já são mais de 25 mil infectados em todo o Brasil. Das 678 mortes constatadas até o momento, pelo menos 170 delas são de anciãos. Muito triste tudo isso. Não é atoa que os povos originários estão muito assustados com tamanho desamparo.
Em meio a tantas mortes, impossível não ficar indignado com os descasos. Além de não se fazer um atendimento diferenciado das populações indígenas, o governo federal impediu neste último dia 20 que a organização humanitária Médicos Sem Fronteiras (MSF) prestasse assistência para prevenir e detectar casos suspeitos de Covid-19 nas aldeias indígenas. O que pensar diante de tal descalabro? A ideia que fica é: quanto mas morrerem, melhor.
Temos um governo apologeta da morte, que pouco se importa com as vidas que se vão. Protagonizando uma política anti-vida, tratou de liberar a compra de armas. Cada pessoa poderá adquirir até quatro armas e o licenciamento delas valerá por 10 anos. Promoção de uma cultura beligerante, num claro intuito de armar ainda mais a população, como se fosse de armas que mais estamos necessitados. Evidentemente que, com este ato irresponsável, armará ainda mais as milícias que atuam livremente em nosso país, tocando o terror.
Outra noticia que também tem nos preocupado é aquela relacionada às denuncias feitas pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), dando conta de que o Padre Redentorista Robson de Oliveira e a Associação Filhos do Pai Eterno (Afipe), usavam de “laranjas” e empresas de fachadas para desviar recursos oriundos de doações de fiéis. Evidentemente que muitas coisas precisam ser esclarecidas nesta história toda. Tal situação me fez lembrar de uma das frases ditas pelo meu amigo Deodato, da comunidade São Francisco de Assis: “Este angu tem muito caroço.”
Nesta via crucis dolorosa e angustiante, busquei refúgio no livro do frei Leonardo Boff, “O rosto materno de Deus”, lançado pela Editora Vozes, no ano de 2012. Nesta obra, o autor nos faz uma narrativa teológica sobre Maria, assumindo em si um Deus na forma feminina. O feminino em Maria sendo elevado ao nível da divindade. A “Comadre de Nazaré”, fazendo uma experiência intimamente profunda, unida ao Espírito Santo e a Trindade santa. A humanidade de Maria tratada de forma vigorosa e profunda, numa relação de amorosidade com as ‘coisas de Deus’. Esta foi a forma que estou encontrando para dar continuidade a um projeto esperançoso de vida, sem deixar abater por tantas coisas tristes que estamos vendo acontecer no nosso entorno.
Maria foi aquela que acreditou! Uma mulher guerreira, que na sua simplicidade, abraçou o projeto de Deus desde o seu sim inequívoco, mesmo perante as incertezas da vida. Uma mulher pobre do meio do povo que na simplicidade de seu existir, abriu o coração para acolher aquilo que Deus havia reservado para ela. Sua vida não foi um mar de rosas, muito pelo contrario. Viveu a incompreensão das pessoas. Enfrentou de cabeça erguida as incertezas humanas. Não teve vida fácil. Esteve presente no calvário, vendo o seu coração rasgar-se de dor. Como mãe, jamais gostaria de ver o seu Filhão ser devorado pelo ódio de seus algozes. É esta mulher que nos encoraja nas dificuldades e nas tentações que temos de cair no desespero ou de fugir da luta. A sua vida peregrina nos faz também caminhar pelas estradas da vida, acreditando que a morte, por mais que seja dolorosa, não será o fim de tudo, mas o começo de uma nova vida que se avizinha.
Maria, modelo de discipulado, nos ensina que o caminhar com seu Filho é exigente demais. O seu coração feminino, transbordante de Deus, nos faz acreditar que o amanhã virá e com ele, uma nova aurora haverá de nos fazer esperançar. Diante da amorosidade de um rosto feminino de Deus, impossível não se lembrar do “Papa do Sorriso”, João Paulo I, que governou a Cúria Romana por apenas 33 dias, em 1978. Disse uma frase que acabou gerando uma grande repercussão: “Deus é mais mãe do que pai”. É a ternura de Deus com o seu jeito feminino de ser, cuidando de todos e de cada um de nós.