O último primeiro

E não é que sextou de novo! Uma sexta feira, que amanheci com ressaca virtual da noite de São João, e quis rezar no dia de hoje tendo a presença viva esta grande profeta que João Batista. Como nos anos anteriores, não pudemos festejar como a devoção popular gosta e deseja, fazendo jus a este santo tão querido de nosso povo. O jeito que alguns encontraram foi festejar em família sem provocar aglomerações, como nos pede o protocolo. Como ontem fui movido pela indignação de ver os povos indígenas sendo maltratados em Brasília/DF, quis deixar para o dia de hoje, a reflexão sobre a vida deste homem singular para a história do cristianismo, pelo que ele representa, em virtude da preponderância de seu profetismo, anunciando aquele que viria depois de si.

João nasce de uma família de pais idosos. Já eram avançados na idade, como confirma a narrativa Lucana. Além do mais, sua mãe era uma mulher estéril e não tinha como engravidar-se. Não tinham filhos, porque Isabel era estéril, e os dois já eram de idade avançada. (Lc 1,7) Deus sempre “aprontando” das suas. De onde não se espera, Ele faz surgir a vida. Portanto, João Batista, nasce por obra e graça do próprio Deus. Segundo a tradição bíblia, João era primo de Jesus. Seus pais, Zacarias e Isabel são os representantes da comunidade dos pobres e oprimidos, que dependem exclusivamente de Deus, já que as autoridades políticas e religiosas viraram as costas para os pobres. Mas Deus se volta para eles e faz nascer no leito de uma família empobrecida, o último profeta da antiga Aliança, abrindo assim, o caminho para a chegada do Messias, dando início a história da libertação dos pobres do Senhor.

Como não podia deixar de ser, João não fugiu à sua estirpe e era um homem simples e humilde, muito embora também tenaz e indignado no seu veio profético, quando se tratava das injustiças cometidas dos grandes contra os pequenos. Jamais um homem resignado. Suas palavras eram lâminas cortantes, falando em nome do próprio Deus. Foi assim no enfrentamento do opressor rei Herodes, ao dizê-lo que ele estava cometendo adultério com a mulher de seu irmão, o que lhe custou a vida, uma vez que fora assassinado por este rei déspota sanguinário. Morreu ainda muito jovem, tendo sua cabeça oferecida numa bandeja, em cerimônia no palácio real.

João é o último e o primeiro. Com ele, é como se as cortinas do Antigo Testamento se fechassem e se abrissem novas perspectivas, novos horizontes, com o Novo Testamento. Ele é o precursor, ou seja, aquele que vem “preparar os caminhos do Senhor”. Ele vem antes, anunciando o Messias, Verbo encarnado em nossa realidade humana. Um homem que sabia quem ele era e qual era a sua missão. Sabia da sua importância e não permitiu que o seu ego inflasse, permitindo que a vaidade humana se sobressaísse. Colocou-se no seu lugar, diante da importância maior do Mestre de Nazaré. Tão importante que era, que o próprio Jesus ao referir a ele dizia: Nenhum homem nascido de mulher é maior que João.

“É preciso que Ele cresça e eu diminua (Jo 3, 30).” Humildade a toda prova. Este era o perfil deste grande homem de Deus, que batizou Jesus nas águas do Rio Jordão e o anunciou vibrantemente: “Eis o Cordeiro de Deus!”. Sabia que não era o Messias e nem se colocava no seu lugar. Tão somente estava preocupado em cumprir a vontade de Deus, permitindo que o Nazareno também cumprisse a sua missão de revelar à humanidade o Reino querido por Deus para os seus. Não se colocava numa atitude de rivalidade em relação a Jesus. Declara que sua missão é tornar Jesus conhecido e seguido, e não se servir d’Ele como trampolim para os seus próprios interesses e possivelmente aumentar o número de seus seguidores. Ademais, como diria Santo Agostinho: “A fraqueza da criatura cede ao poder do Criador e a vaidade dos nossos afetos egoístas dissolve-se diante do amor universal, enquanto João Batista nos grita, do fundo da nossa angústia, a misericórdia de Jesus Cristo: «É necessário que Ele cresça e eu diminua”. Poema: João Batista eu sou – ZÉ VICENTE – Bing video