O Vinho da vida

Segundo domingo do tempo comum (ano C). Ultrapassamos a metade do mês de janeiro. Devagar vamos adentrando o ano de 2022, construindo a nossa história de vida. Tomando pela mão o nosso existir, sendo protagonistas dos nossos sonhos reais. Caminhando com os pés no chão sagrado da vida, tendo nas mãos as rédeas da construção de um mundo para todos e todas. Façamos nós mesmos a nossa história e não deixemos que os outros a façam por nós. “Quem sabe faz a hora não espera acontecer” (Geraldo Vandré).

Domingo da alegria! Sejamos gratos a Deus pelo dom da vida! Saibamos agradecer por cada manhã, cada dia que o Senhor nos concede. Estamos vivos e esta é uma grande dádiva do Criador que nos possibilita encarar a vida de frente na convivência com os que caminham lado a lado conosco. Vivendo intensamente cada segundo em plenitude. Um dia de cada vez. O dia de ontem já se foi. O de amanhã está por vir. Que sejamos presença viva de nós mesmos, na gratuidade da convivência com o outro, saboreando cada instante. Que saibamos fazer da nossa vida aquilo que nos dizia Santo Agostinho (354 d.C., – 430 d.C.): “Viver sempre preparado para morrer, mas viver como se nunca fôssemos morrer”.

Um domingo todo especial para nós. Como de praxe acontece, a liturgia do segundo domingo do tempo comum, nos reserva um dos textos extraídos do evangelista São João. É assim no ano A, ano B e C da liturgia. Tudo porque este evangelista traz para nós a narrativa pormenorizada da vida pública de Jesus, realizando aquilo que ele denomina de “os sinais” do jovem Galileu. Jesus que vai fazendo acontecer entre a comunidade carente, os sinais do Reino de Deus, revelando a face de um Deus que é pura Amorosidade para com os seus. Oportunidade única de mudarmos o conceito que temos de um Deus carrasco e mal-humorado, sempre pronto a castigar os “arameus errantes”.

O texto de João traz para nós o final da primeira semana da vida pública messiânica de Jesus. Ele e os seus discípulos haviam sido convidados para uma festa de casamento. Como Maria, sua mãe, era pertencente a comunidade, ela já se encontrava presente na festa. Para o povo semita (arameus, assírios, babilônios, sírios, hebreus, fenícios e caldeus) a festa de casamento era um grande acontecimento que podia durar até duas semanas. Entretanto, ao colocar Jesus dentro desta festa, João quis refletir a simbologia que estava por detrás desta festa, qual seja o casamento que era o símbolo da união de Deus com a humanidade, realizada de maneira definitiva na pessoa de Jesus de Nazaré, o Deus que se encarna na realidade histórica humana.

Um texto carregado de nuanças simbólicas. O fato de faltar o vinho, por exemplo, significa que seria a mesma coisa da humanidade sem a presença de Jesus, uma vez que Ele é o vinho novo. O Verbo que se encarna na realidade humana, trazendo em si a vida nova querida por Deus para os seus. A nova aliança selada com a humanidade na pessoa do Filho que se faz um conosco. Lembrando que o casamento entre duas pessoas que se amam, representa também a amorosidade com que Deus se relaciona conosco. Jesus que vem revelar para nós a face terna de um Deus que muito nos ama e quer selar conosco este compromisso na ternura do Filho que se dá por inteiro a nós. Não é à toa que Mateus coloca na boca de Jesus, uma das frases que resume toda a ternura de Deus para conosco: “Quero a misericórdia e não o sacrifício”. (Mt 12,7)

Vinho novo da alegria que é Jesus. Vinho que também alegra os corações e a alma. Para o povo judeu, o vinho era a bebida em forma de bênção. Geralmente consumido em diversas ocasiões, sobretudo em ocasiões especiais. Era como se fosse uma espécie de “fio condutor” das comemorações judaicas. Era uma desonra faltar vinho nestas ocasiões especiais. Ao “quebrar o galho” dos noivos, Jesus transforma a água em vinho de ótima qualidade, resumindo assim toda a sua vida pública que, com sua palavra e ação, transformará as relações das pessoas com Deus e destas mesmas pessoas entre si numa comunidade fraternal.

Vinho que também na Grécia antiga, era a bebida nobre dos grandes filósofos. Aquele que era considerado o pai da Medicina Hipócrates (460-370 a.C.) costumava dizer que “O vinho é bebida excelente para o homem, tanto sadio como doente, desde que usado adequadamente, de maneira moderada e conforme seu temperamento.” Já Sócrates (470-390 a.C ) afirmava que “O vinho molha e tempera os espíritos e acalma as preocupações da mente. Ele reaviva nossas alegrias e é o óleo para a chama da vida, que se apaga”.” Aproveitemos, portanto, e façamos um brinde a nossa vida, selada no compromisso que devemos ter com Jesus, o vinho novo. Tomemos uma boa taça de vinho neste domingo e alegremos o nosso espírito, na certeza de fazermos parte desta grande família dos filhos e filhas de Deus. Eu vou tomar um bom vinho ciente daquilo que reza o salmista: “O bom vinho alegra o coração dos Homens.” (Sl 104,15)
https://www.youtube.com/watch?v=R55fSm6Ymms

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.