Obediência vale mais do que sacrifícios

Reflexão litúrgica: segunda-feira, 15/01/2024,
2ª Semana do Tempo Comum

Na Liturgia desta segunda-feira, 2ª Semana do Tempo Comum, na 1a Leitura (1Sm 15,16-23), vemos que os israelitas não foram fiéis às ordens de Deus. Samuel repreende Saul que desobedeceu a Deus, mas Saul se defende, lembrando ao profeta que oferecera a Deus em sacrifício e holocausto o que havia de melhor. Samuel não se mostra contrário aos sacrifícios à divindade, porém prefere os verdadeiros, os que correspondem à obediência e à docilidade interior a Deus. É a linha que seguirão todos os profetas. Quem rejeita a Palavra de Deus é, ele próprio, clamorosamente rejeitado.

No Evangelho (Mc 2,18-22), Jesus explica a utilidade do verdadeiro jejum, pois o jejum caracterizava o tempo de espera, mas, com Jesus presente, esse tempo havia terminado, era hora da festa de casamento, da nova e alegre relação entre Deus e os seres humanos. A atividade de Jesus mostra que o amor de Deus vem para salvar a pessoa humana na totalidade e não para manter as estruturas que sugam o ser humano. A novidade rompe estas estruturas simbolizadas pela roupa e barril velhos. Jesus não veio para reformar; Ele exige mudança radical. Sendo assim, Jesus não renega a prática do jejum, mas o renova em suas formas, tempos e conteúdo.

Hoje, existem muitas formas de jejuns: jejum político e social (estruturas de miséria), jejum saudável ou ideológico (vegetarianos), jejum patológico (anorexia); jejum estético (para manter a forma física). Existe, sobretudo, um jejum imposto pela necessidade: o dos milhões de seres humanos que carecem do mínimo indispensável e morrem de fome. Por si mesmos, estes jejuns nada têm a ver com razões religiosas e ascéticas. No jejum estético, às vezes, se mortifica o vício da gula só por obedecer a outro vício capital, o da soberba ou da vaidade.

É importante, por isso, tentar descobrir o genuíno ensinamento bíblico sobre o jejum. O jejum, por si, é algo bom e recomendável; traduz algumas atitudes religiosas fundamentais: reverência ante Deus, reconhecimento dos próprios pecados, resistência aos desejos da carne, solicitude e solidariedade para com os pobres etc. O jejum bíblico é a postura humana diante das coisas, do ter e do consumir. É ser maior que as coisas. Ter domínio de si. Privar-se de algo em benefício do outro, sentir e comprometer-se com os que são privados de acesso aos bens básicos.

Vivemos, hoje, em uma cultura dominada pelo materialismo e por um consumismo extremo. O jejum ajuda a não nos deixar reduzir a simples consumidores; ajuda-nos a adquirir o precioso fruto do Espírito, que é o domínio de si; predispõe-nos ao encontro com Deus que é espírito, e nos faz mais atentos às necessidades dos pobres.

Mas não devemos esquecer que existem formas alternativas ao jejum e à abstinência de alimentos. Podemos praticar o jejum do cigarro, do álcool e bebidas alcoólicas (que beneficia não só a alma, mas, também, o corpo), um jejum das imagens violentas e sexuais que a televisão, os shows, as revistas e a internet nos lançam diariamente. Lembremo-nos que Jesus nos disse que estas espécies de demônios modernos não se vencem senão com o jejum e a oração.

Para concluir, coloco, a seguir, como praticar alguns jejuns específicos?

– Jejum da língua: evitar falar o que não se deve: fofocas, maledicências, piadas maldosas e inconvenientes etc. Quando falarmos a alguém um fato acontecido, devemos passar pelas três peneiras: “É verdade? É necessário? Vai fazer bem?” Outro exemplo é o saco de penas, depois de espalhadas, dificilmente as recolheremos de volta (Santo Afonso).

– Jejum dos passos: evitar frequentar lugares inconvenientes a um bom cristão. Não se isolar, mas ir ao encontro dos que precisam: doentes, carentes, idosos etc.

– Jejum da visão: deixar de lado aquilo que não engrandece nossa alma (vida interior). Selecionar melhor o que vemos na televisão, na internet etc. Ver, ler e ouvir coisas sadias.

– Jejum do gosto: evitar aqueles alimentos ou hábitos que mais apreciamos ou que nos prejudicam: doces, sorvetes, bebidas, cigarros, drogas etc. Praticar gestos de caridade, ajudar famílias, pastorais etc.

– Jejum do coração: buscar sempre o desapego às coisas que nos atrapalham seguir a Cristo. Buscar a comunhão com Deus, por meio da Palavra, da Oração e da Contemplação.

Boa reflexão e que possamos produzir muitos frutos para o Reino de Deus.

 


Padre Leomar Antonio Montagna é presbítero da Arquidiocese de Maringá, Paraná. Doutorando em Teologia e mestrado em Filosofia, ambos pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR – Câmpus de Curitiba. Foi professor de Teologia na Faculdade Missioneira do Paraná – FAMIPAR – Cascavel, do Curso de Filosofia da PUCPR – Câmpus Maringá. Atualmente é Pároco da Paróquia Nossa Senhora das Graças em Sarandi PR.