Quarta feira da décima segunda semana do tempo comum. Uma quarta feira que começou bem cedo para mim. Fui acordado com o frenesi dos enormes macacos bugios no meu quintal. Tudo por causa de seu ritual de acasalamento, no intuito de fazer procriar a espécie. Uma cena hilária: vários machos, em volta da fêmea, cada um deles tentando impressioná-la com os seus sons característicos. Aquele que encantá-la, será o privilegiado de fazer com ela a copulação. Ritual feito, os demais, saem de perto para que o casal possa ser feliz. Sabiamente, é assim que a natureza procede, perpetuando a espécie. Cada espécie com o seu jeito peculiar.
Aprender com a natureza é o mínimo que podemos fazer, já que, com o nosso processo de desumanização acelerado, somos os donos da verdade e achamo-nos os maiorais, e saímos destruindo tudo à nossa volta. “Ambientalismo é coisa de esquerdopata”, ou “de quem não tem o que fazer”. Com isso, a degradação ambiental em nosso país, alcança índices alarmantes. Nunca de desmatou tanto como nestes últimos quatro anos. O ecocídio está sendo o genocídio do século XXI. Estima-se que cerca de 60 milhões de abelhas tenham morrido neste período, em função do uso indiscriminado de agrotóxicos pelo “agro morte”. De saber que a atuação principal das abelhas nem é na produção do mel, mas na polinização das flores para os frutos da terra.
Fui dormir na noite anterior um pouco aliviado. No dia de ontem (21), o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), aprovou uma manifestação pedindo a exoneração do presidente da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), Marcelo Augusto Xavier da Silva. Tudo por causa do posicionamento deste “ilustre” cidadão na morte do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips. Mais um militar que foi colocado, pelo atual governo, desde 24 de julho de 2019, para estar à frente de um órgão que deveria pautar pela defesa dos povos indígenas. Os órgãos sendo aparelhados por militares, numa tentativa clara de desarticulação de suas principais funções. Ibama, Incra, ICMbio, FUNAI, passando pelo mesmo processo.
Historicamente, desde a colonização, os indígenas vêm sendo dizimados. O primeiro órgão criado para cuidar da questão indígena no país foi o Serviço de Proteção ao Índio (SPI). Criado em 1910, este órgão transitou por vários ministérios, passando pelo Ministério do Trabalho, da Guerra, da Agricultura, até chegar ao Ministério do Interior. Quase sempre numa postura esquizofrênica, tratando as nações indígenas pelo termo genérico colonial de “Índios”, sem levar em consideração a sua especificidade e diversidade etno-cultural. A preocupação maior era a tutela e a necessidade de integração à população brasileira, como se o “ser indígena” fosse uma condição transitória.
O SPI sai de cena em 1967, dando lugar a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), criada pelos militares de plantão. Desta vez, vinculada ao Ministério da Justiça. Prestou um grande serviço à causa indígena, sobretudo por causa dos servidores que por lá passaram, dando suas vidas pela autonomia dos povos indígenas, muito embora, na concepção dos militares, ainda funcionasse a proposta de promover a integração destas populações à “comunhão nacional”. Tivemos até um ilustre sociólogo, que passou pela Presidência da República que, segundo ele, “até o ano 2000 não teremos mais índios no Brasil, pois todos seriam brasileiros”. A árvore da FUNAI não produz bons frutos, uma vez que ser indígena é sinônimo de atraso. Tanto que o indigenista Bruno Pereira, pediu licença de seu cargo no órgão, para conseguir continuar com o seu trabalho na defesa das populações indígenas, como sempre fazia.
Por falar em árvore, hoje nos deparamos com uma reflexão bastante significativa feita por Jesus que chama a nossa atenção. Na liturgia de hoje, seguimos refletindo com o evangelista Mateus. A palavra-chave escolhida por Jesus hoje é “árvore”: “Toda árvore boa produz frutos bons, e toda árvore má, produz frutos maus”. (Mt 7,17) Ou seja, no meio de nós há muitas árvores que não produzem bons frutos. Todavia, para distinguir os bons dos maus frutos”, é necessário que façamos o discernimento para não sermos enganados pela aparência dos frutos. Somos também desafiados a ser nas nossas vidas árvores que produzem bons frutos, pois é pelos frutos que conhecemos a árvore, uma vez que, “uma árvore boa não pode dar frutos maus, nem uma árvore má pode produzir frutos bons”. (Mt 7,18) Nunca me esqueço de uma das frases que estava escrita sobre a porta da biblioteca da PUC de Campinas: “O livro é a sobrevivência da árvore que não morreu em vão”. Que tipo de fruto você está produzindo na árvore da sua vida? O fruto que você produz, alimenta, sacia e ajuda as pessoas à sua volta? Que tipo de árvore é a arvore da sua vida?
Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.