Os pastores de ontem e de hoje

Iniciamos hoje mais uma quarta feira (23). Acordei ainda bem cedo para o meu diálogo, franco, aberto e sincero com o meu Deus. Nestes dias tenho aproveitado para rezar um pouco mais, já que o tempo está a minha disposição, neste período de convalescência. Fazendo memória de tantos amigos e amigas que estiveram, em sintonia, bem junto a mim nestes últimos dias. Não tem sido fácil o desacelerar do motor 6.4. Mas é preciso. Quem sempre esteve no campo de luta da militância pelas causas do Reino, é chamado a quietude do corpo. Militar como dizia Pedro, é apenas e tão somente um verbo. Vivendo estes dias uma vida completamente diferente da minha costumeira vidinha, lá pelas bandas do Araguaia.

Por mais que eu tenha me afastado das notícias últimas, ressoam em meu coração a situação vivida pelas lideranças indígenas no dia de ontem na Capital Federal. Nossos irmãos Indígenas, protestando pacificamente contra a votação do Projeto de Lei (PL) 490/2007, foram atacados covardemente pela Polícia Militar. Lembrando que estas lideranças estavam desarmadas, mas mesmo assim, a polícia mostrou toda a sua truculência, através de balas de borracha, bombas de gás lacrimogêneo e efeito moral, não respeitando ao menos as crianças e idosos que estavam ali presentes.

Lembrando que este Projeto de Lei (PL 490/2007, representa um verdadeiro retrocesso aos direitos constitucionais dos povos indígenas, com a perda de seus territórios sagrados; avanço da grilagem sobre as terras indígenas e aumento do desmatamento, entre outras que se abrirão, caso tal projeto seja aprovado. Sendo que a nossa constituição federal de 1988 assim diz sobre os direitos destes povos: Artigo 231 “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.”

Coincidentemente, no dia de hoje, Jesus nos faz um alerta que serve muito bem para ilustrar a situação descrita acima. Ele nos diz: “Cuidado com os falsos profetas: eles vêm a vocês vestidos com peles de ovelha, mas por dentro são lobos ferozes.” (Mt 5,15) Falsos profetas que estão presentes em todas as realidades humanas. Na política, com os falsos políticos, que foram eleitos para defender os direitos das pessoas e se transvestem em lobos vorazes a serviço dos interesses dos ruralistas, interessados na grilagem das terras dos povos originários. Falsos pastores presentes nas igrejas diversas, falando em nome de um “deus” que serve mais às suas conveniências e aos seus interesses pessoais, distante do Deus de Jesus de Nazaré. Falam aquilo que não vivem em sua prática cotidiana. “Nada se parece tanto com um verdadeiro profeta, como um falso profeta.”

Mesmo diante deste alerta de Jesus, alguns destes pastores, mantem os ouvidos moucos e seguem fazendo das suas, entendendo que assim, estão a serviço do Galileu. Que desserviço, por exemplo, prestou um destes prelados, à Igreja de Jesus, ao afirmar que: “o papel da Igreja é preparar para a vida eterna, não contar mortos”. Em plena crise sanitária, em que já perdemos mais de meio milhão de vidas para a Covid-19, sair com uma frase como esta é, não trazer em seu coração um mínimo de empatia para com os familiares que perderam os seus entes queridos. É claro e evidente que a Igreja precisa se posicionar diante deste genocídio, como fez a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), juntamente com Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns, a Academia Brasileira de Ciências, a Associação Brasileira de Imprensa e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência que, através de uma carta expressaram a mais profunda “indignação” pelas “manifestações contrárias às medidas recomendadas por organismos sanitários, no cuidado e na promoção da vida humana”.
O Papa Francisco, antenado que está, talvez por situações como estas deste pobre pastor tenha se manifestado de forma veemente na audiência que teve esta semana com os diáconos da diocese de Roma ao afirmar: “É triste ver os bispos que se pavoneiam, chega de clericalismo.” As Vossas eminências, que se escondem por detrás de alguns de nossos “pastores” precisam sair mais de seus palácios episcopais e dar uma volta pelas esquinas da vida do povo mais sofrido. Ali verão que a vida ali se transcorre em outros patamares. Transitar por este mundo é ver que a nossa gente está morrendo. Os nossos indígenas estão sendo perseguidos, aniquilados por um verdadeiro genocídio. Sem falar que nunca se assassinou tantas lideranças indígenas no Brasil como nestes últimos quatro anos de governo. Quem sabe, o Espírito Santo atue na Igreja, e suscite novos pastores da linhagem de Dom Hélder Câmara, Dom Tomas de Balduíno, Dom Pedro Casaldáliga. Para ficar nestes quatro homens de Deus, que souberam fazer de seu pastoreio uma entrega total pelas causas do Reino. Sou bom Pastor – Bing video