Partida, tristeza e esperança

Quinta feira da Sexta Semana do Tempo Pascal. O clima de Ressurreição ainda permanece, muito embora a tristeza tenha o seu lugar reservado no coração do discipulado de Jesus. A dor da perda com a partida d’Ele move os sentimentos de seus seguidores, com a morte apontando no horizonte da perspectiva de Jesus. Sua morte iminente está logo ali à frente, sendo anunciada por Ele mesmo. É preciso não deixar dominar pelo desânimo, mas revestir da esperança que renova todas as coisas. Vale aqui uma frase dita pelo pastor e ativista Martin Luther King (1929-1968): “Devemos aceitar a decepção finita, mas nunca perder a esperança infinita”.

Uma quinta feira em que o meu coração está despedaçado. Tudo por causa da triste notícia que recebi no dia de ontem, anunciando a partida de um grande amigo. Outro Chico como este que vos escreve, meu amigo deitou para dormir o sono dos justos e acordou nos braços do Pai. Uma pessoa alegre, esperançosa e atuante, deixou-nos para fazer companhia com os seus irmãos nordestinos como ele, que habitam na morada eterna. Que falta Chico já nos faz, alegrando a estas horas o andar de cima, Mais uma “estrela” a brilhar no céu.

“Se o grão de trigo não cai na terra e não morre, fica sozinho. Mas se morre, produz muito fruto”. (Jo 12,24) Esta é a dinâmica da vida que está na vocação da semente. A vocação da semente é morrer para gerar a vida. Precisa passar pela experiência do “perder-se” para “Ser” e produzir os frutos que dela se espera. Experiência esta que se faz presente na vida de Jesus. Ele é a semente do sonho do Reino de Deus no meio de nós. O Messias predito pelas Escrituras, mostrando, porém sua verdadeira missão: dar a vida para salvar e reunir o povo.

Em Jesus o sonho de Deus vem fazer-se presente no meio de nós. Ele mudou a nossa natureza humana nos aproximando deste sonho de Deus e nos fazendo seres divinizados pela presença sua em nós. O Pai e o Filho habitando o nosso interior e a nossa história. Aquilo que a Filosofia denomina de “Devir Humano”. Ou seja, o divino humano de Jesus se fazendo humanidade em cada um de nós. Assim, Jesus transforma a nossa natureza humana nos aproximando do divino que é Deus. A natureza divina fazendo o humano de tal maneira que o humano faz sua própria natureza divina.

Partida, tristeza e esperança. Somos seres privilegiados, uma vez que o Verbo que se encarnou em nossa realidade histórica, parte para junto do Pai. Uma partida sem provocar a ruptura, já que Ele permanece no meio de nós com o Espírito Santo de Deus, irradiando luz em nossa história. Esta prerrogativa força-nos manter a coerência entre aquilo que acreditamos e a nossa prática cotidiana na vivência de nossa fé. Somos desafiados a manter a coerência entre o pensamento e a prática (práxis), através dos princípios e valores que cultivamos. Cultivar a Fe é manter a esperança acesa na pessoa do Ressuscitado.

“Eu não vos deixarei órfãos: eu irei, mas voltarei, e o vosso coração muito há de se alegrar”. (Jo 14,18) Já está quase lá, mas ainda não. Jesus que segue preparando os seus para a sua partida. Dentro em breve, seus seguidores e seguidoras não verão mais entre eles a pessoa do Jesus histórico. Nada que os façam desanimar e perder a esperança de achar que tudo está perdido, uma vez que, como Ele mesmo diz: “Pouco tempo ainda, e já não me vereis. E outra vez pouco tempo, e me vereis de novo”. (Jo 16,16) É o mistério fecundo de Deus presente na pessoa de Jesus. Sua morte inicialmente significará ausência e tristeza para os discípulos. Todavia, uma morte que dará lugar à alegria, visto que será o princípio de uma presença nova, a presença do Ressuscitado, que age mediante o Espírito Santo.

Partida e tristeza que dará lugar à esperança. Esperança na ação. Vida nova que se inicia. Acreditar na presença viva do Ressuscitado é estar pronto a dar continuidade às mesmas ações d’Ele no meio de nós. A história sendo continuada pelas nossas mãos. A utopia do Reino aponta no horizonte das nossas ações. A hora é agora! Reino que já está no meio de nós e ainda não. O já do Reino que acontece cada vez que fazemos acontecer atos de amor e justiça, fraternidade e solidariedade. O “já” e o “ainda não” da plenitude da esperança na prática (práxis) que vamos desenvolvendo com as nossas ações cotidianas. Que não sejamos exemplos vivos daquilo que fora dito pelo padre e escritor Francês do século XVI François Rabelais: “Conheço muitos que não puderam, quando deviam, porque não quiseram quando podiam”.


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.