Pedro Terra

O seu dia chegou! O nosso dia chegou! Sabíamos que um dia iríamos ficar sem você. Esse dia chegou! Você volta para a terra. Aliás, você uma pessoa íntima da terra, entrou definitivamente em sintonia/comunhão com ela. Você sempre foi terra. Pedro terra! E não foram as suas sandálias surradas (prelazia) que o separava dela. Vocês dois sempre foram um em dois. Cúmplices. Você soube como ninguém valorizar a nossa mãe terra. Pisava nela com leveza e com carinho. Com a energia do profeta, mas também com o carinho do poeta, que a tratava em prosa e verso.

A morte é sua Irmã. Como Francisco de Assis, você sempre a tratou como irmã muito próxima a si. Você e o santo medieval de Assis são muito parecidos. Ambos sabiam e viviam, tendo a morte como, a “irmã morte” e não como uma inimiga terrível. Na verdade, você sempre conviveu com a morte rondando a sua vida. Quem não se lembra do seu cartão de visita, nos primeiros dias, estando em São Félix do Araguaia? Trouxeram uma criança falecida e a colocaram na porta de sua casa, para que você providenciasse o enterro daquele anjo, dos muitos que perdiam suas vidas para a alta taxa de mortalidade infantil à época. Você providenciou o enterro, mas também aproximou da família, em solidariedade, mas também para dar voz, aquela situação gritante.

Quantos peões assassinados pelo latifúndio cruel e desumano, seu inimigo por longo período? Bem cedo, você percebeu que as forças da morte, não lhe dariam trégua. Foi assim que você viveu grande parte da sua vida, correndo risco de morte permanentemente. Estando sempre na mira das armas da morte. Mas nem por isso, você deixava de fazer o que tinha que ser feito: anunciar, mas sobretudo, denunciar os horrores do latifúndio, que aqui no Estado de Mato Grosso sempre esteve presente. E olha que você andava pra lá e pra cá, sem medo de ninguém. E ainda expressava esta situação, através da sua poesia revolucionária: “Eu morrerei de pé como as árvores. Me matarão de pé. O sol, como testemunha maior, porá seu lacre sobre meu corpo duplamente ungido.

Pedro um homem de Deus! Tão humano que se aproximava por demais da humanidade de Deus. Você estava tão próximo d’ELE que a gente percebia a sua presença no seu corpo frágil. Estar ao lado seu era um privilégio de poucos, pois de ti irradiava uma energia tão forte, que chegava até nós em forma de boas vibrações. Sua casa, então, era um campo magnético energizado pela sua presença. Quantas vezes entrei em sua casa e senti todo o meu corpo arrepiar. Você exalava esta energia toda.

O bispo preguiçoso, como você se definia ultimamente, não está mais aqui em presença física. Está doendo muito aqui dentro, conviver com esta triste realidade. Todavia, aprendemos muito com você. Até com o seu bom humor de chamar a doença que o acometia de “Irmão Parkinson”. E ainda fazia piada dizendo que quem mandava em você era o doutor. Parkinson.
Mas você também realizou o seu ultimo desejo: ser sepultado no mesmo cemitério do povo Iny (Karajá). Ali onde estão sepultados dezenas de corpos de peões assassinados pelos latifundiários. Seus restos mortais seguem aqui entre nós, tendo o Araguaia como testemunha de sua vida doada feito martírio, na defesa dos Direitos Humanos. Isso para você era muito claro, repetido inúmeras vezes, através de sua voz profética.

Pedro, você encerrou um ciclo dos bispos que tiveram as suas vidas marcadas pelo profetismo. Os outros foram à sua frente. Dos muitos bispos, que aqui ficaram, não se vê mais esta coragem profética de anunciar e denunciar na mesma proporção que vocês faziam. A nossa Igreja arrefeceu o profetismo e muitos dos nossos pastores, são meros repetidores de chavões clericais, como meros cumpridores de ritos vazios do Espírito de Deus, revelado no peregrino de Nazaré.

Há muito que não se faz mais bispos como antigamente. Precisou que um grupo deles (152), alterasse a sua voz, para denunciar um governo odioso e genocida e, ao mesmo tempo, chacoalhasse a CNBB, escondida atrás da instituição. Que responsabilidade nos foi repassada por ti, Pedro. Ter que dar continuidade ao seu projeto de Igreja dos pobres, marcada pela presença do RESSUSCITADO, caminhando com ela. Não vai ser nada fácil, bem o sabemos. Mas você terá que interceder, por cada um de nós, lá de cima, para que sejamos fieis ao seu sonho Pedro terra de ser. Teimosia e profetismo encarnado.