Diferentemente da bela canção de Beto Guedes e Ronaldo Bastos “Sol de Primavera” que inicia dizendo: “Quando entrar setembro. E a boa nova andar nos campos. Quero ver brotar o perdão. Onde a gente plantou. Juntos outra vez…” Setembro chegou e não nos trouxe nem sossego, nem paz e muito menos tranqüilidade. Seguimos na mesma incerteza e insegurança, com as mortes acontecendo aos borbotões. E o que espanta já nem são mais as milhares de vidas ceifadas, mas a preocupação dos nossos políticos com as tais eleições. Brevemente estarão em plena campanha eleitoral e que se lasque quem perdeu os seus parentes, amigos para a Covid-19.
O horizonte possível escapou do nosso campo visual. Não conseguimos projetar nem o amanhã, quanto mais o ano que vem. Estamos com os nervos a flor da pele que “qualquer beijo de novela nos faz chorar”, como canta Zeca Baleiro em sua canção. Estamos diminutos dentro de nós mesmos, tentando encontrar uma luz na madruga escura da noite. Nos apegamos aquilo que nos resta de esperança, buscando no fundo de nossa alma, uma centelha de luz, que nos mostre o caminho a seguir. Somente a força suprema de Deus para nos acalentar.
Estamos carentes do colo de Deus, a embalar nosso sono tranqüilo. Nunca desejamos tanto cair dentro do abraço do amigo de todas as horas. As redes digitais nos colocam em sintonia com eles, mas não sentimos o seu peito pulsar no compasso das batidas de nosso coração. Muito menos podemos desfrutar do calor de seus corpos e saudá-los como antes, nos encontros festivos. A hora já vai adiantada, mas o dia não vem, trazendo o amanhecer que desejamos. Somos movidos por dúvidas e incertezas mil, por mais que os pensamentos otimistas, tentem nos devolver a segurança do viver.
Voltando ao cantor mineiro e compositor mineiro Beto Guedes, “Já choramos muito. Muitos se perderam no caminho. Mesmo assim não custa inventar. Uma nova canção
Que venha nos trazer…” Que venha nos trazer logo, e não demore mais, o sol de primavera que tanto ansiamos. Já estamos cansados do olhar frio e distante sobre aqueles que amamos. As expressões faciais não nos deixa ver o que as pessoas dizem escondidas atrás de uma máscara. Tivemos até que nos alfabetizar para aprender a olhar nos olhos das pessoas e ler o que elas estão sentindo e pensando.
Este é o lado nu e cru das nossas vidas atuais. A pandemia chegou para ficar, por mais que as pessoas sigam desafiando o vírus da morte, com os descuidos costumeiros. Todavia, há também o outro lado que precisamos aprender a enxergar. Este outro lado está a nos dizer que, nem tudo está perdido. Estamos ainda vivos, e em condições de abrir a mente e o coração para uma nova realidade que desponta. Aquela que nos faz ver que, somos pequenos, do tamanho da humildade que se expressa, na simplicidade de nosso ser. Do nada de nossa vida, brota a força maior da esperança, que se faz enorme, empurrando-nos para novos horizontes de nosso existir.
O monge tibetano Dalai Lama já nos advertia que: “É durante as fases de maior adversidade que surgem as grandes oportunidades de se fazer o bem a si mesmo e aos outros. Penso que aqui reside uma grande oportunidade de fazermos diferente do que vínhamos fazendo até então. Porque não encarar este momento, com aquela grande chance de inaugurar o novo em nossas vidas, abraçando definitivamente o meu novo eu, adormecido pela indiferença, em relação às outras pessoas, sobretudo aquelas que estão em situação de maior vulnerabilidade.
Convivi com um homem que conjugava a esperança em todos os tempos do verbo. Era a esperança em pessoa. O profeta da esperança. Ele nos dizia que, se a situação é difícil, maior deve ser a esperança. Pedro, junto com Dom Paulo Evaristo Arns, viveram suas vidas pautadas de esperança em esperança. Nunca desanimaram, mesmo com todas as adversidades possíveis. Nem as armas da morte, fizeram Pedro recuar naquilo que acreditava. E foram várias tentativas de tirar-lhe a vida, mas seguia de cabeça erguida, nos encorajando também no enfrentamento das dificuldades. A esperança em Pedro era antes de tudo um ato de rebeldia, teimosia e resistência, para fazer acontecer o sonho possível do amanha do Reino.
Que venha setembro e todos os demais meses, onde poderemos viver, cantar e dançar a esperança. Esperança de dias melhores, em que a vida esteja presente em todas as suas dimensões. Lá não haverá mais mortes anunciadas de pobres e inocentes, e os arquitetos do ódio, da dor e da morte, estarão bem longe de nós, pois já os teremos vencido com a força do amor de uma esperança, resistente e teimosa. Viva a esperança! Viva todos aqueles e aquelas que fazem de suas vidas o berço nascedouro da esperança.