Profetiza da libertação

 

Domingo da solenidade da assunção de Maria. Uma festa tradicional da Igreja Católica. Neste dia, as comunidades eclesiais espalhadas pelo Brasil, como a comunidade Catedral de São Félix do Araguaia, celebram esta importante festa. Maria, a mãe de Jesus, foi elevada ao céu. Ou seja, segunda a tradição (dogma), a Mãe de Jesus, foi glorificada em corpo e alma e levada ao Céu, ao final da sua vida terrena. Segundo este dogma, que traduzido quer dizer, uma verdade de fé absoluta, foi promulgado durante o pontificado do Papa Pio XII, em 1º de novembro de 1950, através da constituição apostólica Munificentissimus Deus.

Maria é aquela mulher simples, chamada por Deus para fazer parte de seu projeto salvífico para a humanidade. Independente de dogmas ou não, o que importa é que ela aceitou e assumiu, desde o início, ser instrumento nas mãos de Deus, contribuindo assim para que Deus, através de seu Filho, encarnasse na realidade humana, fazendo-se um conosco na nossa história. Maria, aquela que acreditou e se uniu aos pequenos, fazendo de si, porta-voz das causas do Reino, libertando os pobres e marginalizados. A partir de então, os excluídos e invisíveis da Palestina, bem como todos os pobres, podem olhar para esta mulher e enxergar nela o rosto materno de Deus, pois ela é a Mãe profetiza da libertação.

Ser Igreja é seguir nas mesmas pegadas desta mulher libertária. Colocar-se ao lado daqueles de quem lhes é tirado seus direitos e a sua dignidade. Há uma celeuma muito grande por parte de alguns, quando veem a Igreja, na sua fidelidade ao seguimento de Jesus de Nazaré, se posicionar ao lado dos pequenos. Afirmam que a Igreja, neste caso, está fazendo política. Mediante tais situações, não tem como não nos lembrarmos de nosso bispo Pedro. Para estes, ele afirmava que, “há a politica de uns e a politica de outros”. Pedro tinha lado. Evidentemente que ele se colocava ao lado da política dos pequenos, fazendo com eles a caminhada da libertação.

“A preocupação com os pobres é Evangelho, não comunismo.” Esta foi uma das falas ditas pelo Papa Francisco. Segundo ele, sua preocupação com os pobres e sua crítica ao sistema econômico global não é uma novela de inspiração comunista, mas, sim, a premissa da fé cristã. Esta é uma das inspirações Marianas para o seguimento fiel de Jesus de Nazaré. A defesa intransigente dos pobres, é uma das prerrogativas de Deus na sua proposta de implantação do Reino entre nós. Isto tem que ficar muito claro para aqueles e aquelas que desejam fazer a sua adesão ao Projeto de Deus revelado em Jesus, seguindo nas suas mesmas pegadas. Deus tem lado. O lado dos pobres.

Foi o que fez, por exemplo, Dom Óscar Arnulfo Romero Galdámez, mais conhecido como Santo Óscar Romero de América. Hoje estamos celebrando a data de seu aniversário natalício. Estaria hoje completando 104 anos. Arcebispo metropolitano de San Salvador, capital de El Salvador, foi assassinado no dia 24 de março de 1980. Exatamente no momento em que celebrava a Eucaristia. Um tiro certeiro, tirou-lhe a vida física. Seu sangue, derramado ali no altar, misturou-se com o sangue do memorial da Paixão Morte e Ressurreição de Jesus de Nazaré. Para desespero de seus algozes assassinos, Romero, junto ao Ressuscitado, continua firme naqueles e naquelas que abraçaram e ainda abraçam as causas dos pobres, como testemunhas fieis. São Romero de América, mártire da caminhada.

Maria, a mãe profetiza da libertação! Mãe dos pobres e indefesos! Mulher servidora e solidária como tantas outras mulheres que temos em nossas comunidades. Mulheres que, na perspectiva de Pedro, tinham um lugar definido na Igreja da libertação. A seu ver, a “Igreja hierarquizada”, ainda não era suficientemente feminina e maternal. Aliás, na sua visão, a Igreja tinha uma dívida histórica para com as mulheres, pois o patriarcado clerical, não permitia que as mulheres tivessem assento nos espaços de poder e decisão. Uma Igreja de predominância masculinizada, cujos símbolos do poder clerical, impedia de ser uma Igreja maternal e servidora como Maria de Nazaré.

Maria é aquela mulher inquieta, que sai de si e vai ao encontro do outro, onde quer que ele se encontrasse. O exemplo clássico desta sua atitude desinstaladora é o que vemos no texto de Lucas do evangelho de hoje. (Lc 1,39-56) Sendo ela quem era, não tinha necessidade alguma de prestar serviços à Isabel. Não contente com a solidariedade àquela mulher em via de dar à luz, proclama um dos mais belos textos bíblicos de defesa dos marginalizados: “Derrubou do trono os poderosos e elevou os humildes. Encheu de bens os famintos, e despediu os ricos de mãos vazias.” (Lc 1,52-53). Que mulher porreta, diriam os Nordestinos. Em Maria, Deus assume o partido dos pobres, realizando a transformação necessária da história. Com ela, há uma inversão da ordem social: os ricos e poderosos são depostos e destituídos, e os pobres e oprimidos são libertos e assumem a direção dessa nova história. Viva a Mãe de Deus e nossa!