Renascer da esperança

 

Segunda feira marota. Dia dedicado à preguiça. Em dias como este, é difícil quem não acorda com ela alojada no corpo. Aos poucos, vamos vencendo-a deixando que a teimosia e a persistência assumam as coordenadas de nossas vidas, afinal a vida segue o seu itinerário. Como diz o arquiteto e escritor inglês Thomas Wittlam (1799-1861): “Vencer a preguiça é a primeira coisa que o homem deve procurar se quiser ser dono do seu destino.”

Acordei ainda muito cedo e rezei na intimidade de meu quintal, no mais absoluto silêncio. Meus inquilinos deixaram se vencer pela preguiça da segundona. Apenas uma mamãe sabiá, alimentava o seu filhote, depositando ali no bico de sua criatura, o alimento necessário para o seu desenvolvimento natural. Enquanto isso, o papai sabiá, observava a cena ali do lado compenetrado, certamente pronto para defender a família diante de possíveis ameaças. Assim, a vida vai acontecendo na nossa Casa Comum. Os demais seres que habitam o espaço da Mãe Natureza, percebem quando não representamos ameaças aos seu modo de vida. Sentem-se livres para aproximar-se de nós. Esta é uma das experiencias que faço a cada dia por aqui.

Encerramos neste final de semana a “Semana Pedro Casaldáliga.” Momentos fortes de retomada do legado deste grande homem de Deus. Muitas pessoas se fizeram presentes neste evento tão marcante. Mesmo que alguns por aqui, fazem questão de não lembrar que Pedro passou por estas terras, e marcasse profundamente a caminhada desta Igreja, Povo de Deus em Marcha. Celebrar um ano de sua páscoa, teve o significado de trazer presente a poesia, sua mística e a costumeira teimosia do profeta dos pobres do Araguaia, fazendo reviver as utopias do Reino. Pedro está mais vivo do que nunca, sobretudo naqueles e naquelas que não permitirão que sejam esquecidas as suas lutas e as suas causas.

“Nós somos o povo da esperança, o povo da Páscoa. O outro mundo possível somos nós! A outra Igreja possível …”, afirmava Pedro, seja nos seus escritos, ou mesmo nas suas falas entre nós. Um renascer da esperança se faz urgente e necessário, sobretudo neste atual momento em que estamos vivendo. A hora da morte se faz presente no meio de nós, não apenas pela ação de um vírus letal, mas também por aqueles que arquitetam a morte dos pequenos e indefesos. No nosso coração e nas nossas atitudes cotidianas, precisamos revestir-nos desta esperança, típica daqueles que sonham e lutam por outro mundo possível, em que as forças da morte e a política necrófila, não tenham a última palavra. O esperançar não será em vão, até porque o Ressuscitado, é a presença viva do Deus conosco no meio de nós.

“Não matarás, não cometerás adultério, não roubarás, não levantarás falso testemunho, (Mt 19,18), diz-nos Jesus no dia de hoje. O Mestre sendo bastante incisivo com aquela pessoa que o procura, desejosa que estava de entrar na dinâmica do Reino proposto por Jesus. E aqui não se trata apenas de uma vida futura pós morte, mas de algo que começa acontecer no aqui e agora de nossa história. Fica claro que não basta ser um exímio cumpridor de preceitos, leis e regras. Significa ser alguém que seja capaz de partilhar tudo com todos. Daí o porquê daqueles que muito possuem ficarem tristes, pois jamais serão capazes de abrir mão do acúmulo de seus bens e riquezas, colocando-as à serviço de todos. Ou seja, o Reino é dom de Deus às pessoas, e nele tudo deve ser partilhado entre todos e todas. É por este motivo que a Eucaristia é o memorial da Paixão, morte e Ressurreição de Jesus. Só há lugar nesta mesa da partilha do Pão, para aqueles que sabem partilhar, o pão os dons e a riqueza.

Viver o Reino de Deus é viver a partilha permanentemente. Para Deus, é inconcebível que uns tenham tudo e os demais nada possuam, nem o necessário para viver. A vida sem partilha é o projeto diabólico da força do capital. Tal situação fez-me lembrar da letra de uma das canções de Pedro, em parceria com o Frei Domingos dos Santos: “Somos um povo de gente, somos um povo de Deus, queremos terra na terra já temos terra no céu.” É o Reino aqui e agora, “com fé em Deus e teimosia. E na força da união.”