Quinta feira da quarta semana da páscoa. Seguimos ainda no clima pascal, refletindo os textos apropriados para este tempo litúrgico. Textos densos de significado e que nos incomoda por demais. Seguir os passos de Jesus não é nada fácil. Mais do que dedicar horas a fio nas celebrações da comunidade, requer de cada um de nós um posicionamento firme e decidido no seguimento das pegadas de Jesus, edificando o Reino desejado por Deus entre nós. Viver a vida com intensidade como dom total de Deus.
Continuamos hoje a narrativa bíblica transcrita pela comunidade Joanina. A temática abordada por Jesus hoje é instigante. Estar ou não a serviço do irmão, da irmã. Somos interpelados a fazer da nossa vida um serviço abnegado à causa dos irmãos. A proposta de Jesus é clara e objetiva: “O servo não está acima do seu senhor e o mensageiro não é maior que aquele que o enviou” (Jo 13,16). Só é capaz de desenvolver em si esta máxima de Jesus, quem se move pelo amor supremo a Deus e ao outro. Ser autoridade neste contexto, só pode ser entendida como função de serviço aos outros. Ou seja, na comunidade cristã haverá sempre diferença de funções, mas todas elas devem ser mediadas pelo amor mútuo. Já não se justifica nenhum tipo de superioridade, mas somente a relação pessoal de irmãos e amigos.
Esta fala de Jesus pode ser que seja muito dura para alguns dos nossos, acostumados que estão de serem servidos e não de servir. O serviço precisa estar na ordem do dia de nossa igreja. Jesus não deixa nenhuma margem de dúvida. A ideia inicial defendida por Ele é a de que os seus seguidores e seguidoras devem ser antes de tudo, aqueles que servem. Jesus jamais imaginou que os seus, fossem grandes e poderosos como as pessoas ligadas ao poder. Pelo contrário, propõe para aqueles que o quisessem segui-lo: “Quem de vocês quiser ser grande, deve tornar-se o servidor de vocês, e quem de vocês quiser ser o primeiro, deverá tornar-se o servo de todos. Porque o Filho do Homem não veio para ser servido. Ele veio para servir e para dar a sua vida como resgate em favor de muitos.” (Mc 10, 43-44)
O critério primeiro, portanto, para fazer parte desta igreja é o serviço à causa do Reino. Dai percebemos o quanto estamos distantes da proposta originária de Jesus, uma vez que muitos dos seus seguidores se colocam na postura de serem servidos e não de serem servidores dos demais. Basta vermos alguns membros da Igreja, que são verdadeiros “reis”, que se sentam no trono de seu comodismo, a espera que os outros o venham lhe servir. Uma igreja acomodada, indiferente, ao sofrimento e a dor, sobretudo dos mais vulneráveis. Uma igreja eximia na arte de celebrar os sacramentos, mas distante do serviço aos mais necessitados, como aquele padre que fez um comentário infeliz, a partir de um resort de luxo que costuma frequentar.
Uma igreja servidora, eis o que nos propõe o “Servo Sofredor”. Ser o servo que serve a todos, particularmente aos empobrecidos, eis o grande desafio de uma igreja que se quer seguidora dos passos de Jesus de Nazaré. Entretanto, esta ainda não é a unanimidade dentro da igreja. Nela há ainda alguns membros que classificam a atuação daqueles que se dedicam aos mais pobres com o chavão esquizofrênico de “esquerdistas”. Ou seja, quem luta pelos direitos dos despossuídos, são taxados de comunistas. Nesta linha de raciocínio deles, Dom Hélder Câmara, Dom Paulo Evaristo Arns, foram comunistas. Nosso bispo Pedro então, nem se fala. Padre Júlio Lancellotti está sofrendo na própria pele, a opção de ser o “Servo sofredor” com as pessoas em situação de rua, em São Paulo. Ou seja, alem de não buscar o serviço, como quer Jesus, ainda atacam aqueles que entenderam a sua proposta e seguem lutando pelos sem vez e sem voz desta sociedade, cruel e desumana. “Sentir dor é normal. Sentir a dor do outro é ser humano”. (autor desconhecido)
Uma igreja servidora de todos. Igreja que saiba ser Maria e dar o seu sim e acreditar que Deus agirá na história. Uma Igreja samaritana, que saiba enxergar a realidade de sofrimento dos irmãos e saiba acolher e cuidar daqueles que mais necessitam. Uma Igreja que desperte a sua sensibilidade de ver a realidade pela ótica e pelo coração de amorosidade das mulheres. Uma Igreja que esteja a serviço do servo sofredor. Uma Igreja menos sacramental e mais dedicada aos excluídos e marginalizados. No mais, façamos também nossa uma das frases ditas pela grande doutora da Igreja Santa Catarina de Sena (1347-1380), que hoje celebramos a sua festa “Para fazer o mal, basta que se deixe de fazer o bem”.