Tempo, tempo, tempo

Enfim estamos chegando a mais uma quinta-feira (18). Já vivendo a segunda quinzena do mês de março, em meio à quaresma diferente de todas as outras já vividas. Em meio a uma pandemia que suga as nossas energias, fragilizando o nosso estado de espírito. Nos emocional segue depauperado, com tantas forças negativas a nos rondar. As certezas se foram e no seu lugar ficou um grande vazio existencial, que vamos preenchendo da forma que dá. Vamos caminhando de esperança em esperança, acreditando sempre num outro porvir.

O filósofo de Éfeso Heráclito (540-470), que nos dizia: “Nada é permanente, exceto a mudança”, nos faz pensar o nosso cotidiano frente ao contexto atual. O que está mudando em nossas vidas afinal? O que sentimos de mudança significativa desde que ficamos sabendo que passaríamos por momentos turbulentos, com a chegada de uma grande crise sanitária? No que avançamos e no que retrocedemos? Que passos foram dados no sentido das realizações do ser humano?

Confesso que rezei hoje, tendo em mim todas estas indagações. Dada a complexidade do ser humano, com as suas contradições, é deverasmente difícil entender o que se passa na cabeça e no coração de algumas pessoas, sobretudo daquelas que vivem como se estivessem em outro mundo, outra realidade. O aparente, por mais que esteja translúcido aos olhos, tais pessoas não enxergam, ou fazem questão de não querer enxergar. E ao comportarem desta maneira, vivem num mundo obtuso, como se este fosse feito à sua imagem e semelhança.

É preciso muito amor no coração e nas atitudes, para não surtar e saber conviver com tais situações. Eu diria que precisamos revestir-nos também de muita paciência. Paciência histórica, para não atropelarmos o processo, no seu transcurso natural e também sermos atropelados pelas nossas angustias e decepções. Talvez por este motivo, Karl Marx tenha nos dito que “a nossa pressa histórica não apressará o momento histórico”.

Como é difícil aceitar que o outro não consiga enxergar aquilo que estamos enxergando. Está tão claro, que seria impossível não enxergar. Nestas horas vem a mente um dos provérbios populares que diz assim: “Tolo é aquele que, ao mostrar-lhe a lua, ele fica olhando para a ponta de seu dedo”. Falta-lhe discernimento, intuição e aquilo que Paulo Freire, insistentemente, nos dizia: leitura de mundo. Pressupõe uma atitude dialogal com o saber e com aquilo que se vê, brotando da realidade. Todavia, “Um diálogo não pode existir, entretanto, na ausência de um amor profundo pelo mundo e pelas pessoas… Porque o amor é um ato de coragem, não de medo, amor é compromisso com os outros”. (Paulo Freire)

Há tempo pra tudo nesta vida. Neste sentido, o capitulo terceiro do sapiencial do Eclesiastes nos dá uma boa dica de como encarar cada um dos tempos: “Debaixo do céu há momento para tudo, e tempo certo para cada coisa: Tempo para nascer e tempo para morrer. Tempo para plantar e tempo para arrancar a planta. Tempo para matar e tempo para curar. Tempo para destruir e tempo para construir. Tempo para chorar e tempo para rir. Tempo para gemer e tempo para bailar. Tempo para atirar pedras e tempo para recolher pedras. Tempo para abraçar e tempo para se separar. Tempo para procurar e tempo para perder. Tempo para guardar e tempo para jogar fora. Tempo para rasgar e tempo para costurar. Tempo para calar e tempo para falar. Tempo para amar e tempo para odiar. Tempo para a guerra e tempo para a paz”. (Ecle 3,1-8)

Ufa! Haja discernimento para cada um de nós! Numa atitude sincera de revisão de vida, precisamos discernir, em qual destes momentos estamos nós vivendo? Lembrando de antemão, que somente Deus tem uma visão do conjunto da vida. Somente ELE tem a visão deste todo que compõe cada um destes momentos. Para nós ainda parece muito incerto, dada a nossa limitação de vislumbrar este conjunto. Desta forma, cabe-nos aceitar cada momento presente como dom de Deus, e ter discernimento para fazer a coisa certa no momento certo, na hora certa. Evidentemente que não iremos mudar o mundo, sem antes mudar-nos a nós mesmos, naquela mesma perspectiva que nos diria o filósofo Platão: “Tente mover o mundo – o primeiro passo será mover a si mesmo”. Tente! Tente! Tente! Tente outra vez! Além do mais, “Não fazemos aquilo que queremos e, no entanto, somos responsáveis por aquilo que somos.” (Jean-Paul Sartre)