Iniciamos mais uma semana. Felizmente muita chuva desceu do céu nesta noite de domingo para segunda. O tempo amanheceu nublado e fresco, diferente do costumeiro calor que predomina pelas bandas do Araguaia. Tempo que desperta em nós certa melancolia. Talvez por isso, eu tenha recorrido ao Padre Zezinho, para iniciar o meu dia. Um Certo Galileu, fez história e reconduziu muitos jovens como eu ao seminário. Sou um exemplo vivo desta realidade. Embalados pelos versos desta canção, não tinha como não se emocionar e sentir o chamado vocacional dentro de nós: “Um certo dia, à beira mar. Apareceu um jovem Galileu. Ninguém podia imaginar, que alguém pudesse amar do jeito que ele amava. Seu jeito simples de conversar, tocava o coração de quem o escutava.”
Estamos vivendo o day after das eleições. Um dia após o sufrágio, estamos contabilizando os estragos. Mais decepções do que propriamente alegrias. O poder econômico falou mais alto e as pessoas se deixaram levar pelo “canto da sereia”. Mais uma vez, as palavras enganosas deram lugar à verdade propriamente dita. A democracia tem disso: nem sempre vence a melhor opção como candidato. Os eleitores ainda se deixam levar pela aparência ou pelo poder de compra do voto. Se compra e se vende voto com muita facilidade.
De fracasso em fracasso, vamos enfim vivendo a nossa vidinha. Nestas horas, impossível não pensar nas palavras do grande escritor e antropólogo mineiro, Darcy Ribeiro que diz: “Fracassei em tudo o que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui. Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei fazer uma universidade séria e fracassei. Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu.” Esta é a mesma sensação, que estou vivendo, depois do resultado destas eleições. Fracassei também, mas jamais gostaria de estar do lado daqueles que triunfaram. Neste sentido, minha consciência está em paz.
Ser cristão e seguidor de um certo Galileu é estar preparado para o fracasso sempre. O Projeto de Jesus é um projeto aparentemente fracassado, se olharmos pela perspectiva da sociedade em que vivemos. “O importante é levar vantagem em tudo”, já nos dizia a famosa “Lei do Gerson”. Uma sociedade extremamente competitiva e desigual, levando muitas das pessoas a viverem na exclusão como seres esquecidos. Esta é a sociedade dos vencedores da qual Darcy faz referência. Estar do lado deles é estar do lado daqueles que promovem a morte dos inocentes. Como bem dizia Pedro: “É fácil levar o crucifixo de Jesus no peito. O difícil é ter peito e coragem para seguir Jesus.”
Encerrei a minha oração refletindo o evangelho do dia. (Lc 18,35-43) Nele Jesus devolve a visão a um cego. Permite que aquele pobre coitado volte a enxergar novamente. Esta cura do cego simboliza a fé, que é a visão do compromisso com Jesus. De olhos bem abertos para nova maneira de ver e agir, ele segue a Jesus que vai dar a vida. Quantos de nós hoje não estamos precisando recuperar a nossa visão? Recuperar a visão, no sentido de enxergar aquilo que está mais do que evidente para nós, mas mesmo assim, alguns de nós ainda insistimos em não querer ver. Nestas eleições muitos de nós fomos às urnas não somente com as máscaras, mas também de olhos vendados, para não enxergar a realidade evidente, votando em candidatos que representam os interesses dos grandes e poderosos, em detrimento da vida sofrida do povo em geral.
A cegueira, infelizmente faz parte das nossas vidas. Estamos sendo governados por cegos. O espaço da política está contaminado por muitos outros cegos. A justiça por sua vez, se faz também cega e insiste em estar do lado de lá. Do lado de cá, estamos todos sendo guiados por cegos. E quando somo guiados por cegos, o próprio Jesus está a nos dizer: “Ora, se um cego guia outro cego, os dois cairão num buraco.” (Mt 15, 14). Ou seja, a nossa nação está indo ladeira abaixo, rumo ao precipício. O resultado destas ultimas eleições está aí para confirmar esta situação. Não há como não enxergar esta realidade, da mesma forma que não dá para ficar calado. Por fim, faço minhas as palavras do pastor batista norte americano Martin Luther King: “O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons.”