Um sentido para viver

Sexta feira da Quinta Semana do Tempo Comum. O mês de fevereiro vai transcorrendo e assim vamos nós, na busca de um sentido para o nosso existir. A vida nova requer postura de quem adere ao projeto salvador de Jesus. Não basta viver por viver, mas viver encontrando sentido de estar aqui e agora, sendo construtores desta realidade. A indiferença e a ingratidão são dois sentimentos que não combinam com o ser cristão. Passar por esta vida e tê-los presente em nós, mostra que não entendemos direito a proposta da vida nova que o Mestre Jesus veio nos trazer.

Somos seres de sentidos. Eles fazem parte do nosso modo de ser e viver. Trazemo-los em nós. Humanos que somos, possuímos os cinco sentidos tradicionalmente conhecidos. Eles estão relacionados com a percepção do meio interno e externo: olfato, paladar, visão, audição e tato. Desta forma, Os meios interno e externo nos dão a dimensão exata de uma grande variedade de sensações, que são percebidas graças ao nosso sistema nervoso e aos nossos órgãos dos sentidos. Cada um deles está adaptado a responder a um determinado estímulo, possuindo assim receptores sensoriais capazes de transformar esses estímulos em impulsos nervosos.

Meu sentido mais aguçado da escuta amanheceu nesta manhã captando os sons da natureza que se fez presente em meu quintal. Senti Deus se manifestando em cada uma das suas criaturas, como se estivessem em louvação pelo dia que dava apenas os seus primeiros acordes. São Francisco de Assis certamente diria em tal situação: “louvado seja meu Senhor, por todas as suas criaturas!”. O Deus que nos criou fazendo acontecer suas maravilhas na manifestação de suas pequenas criaturas inocentes em adoração ao ser Criador de Deus. Diante deste contexto, impossível não pensar naquilo que nos fora dito pelo educador francês Allan Kardec (1804-1869): “O Universo é a criação suprema de Deus. Abrange todos os seres racionais e irracionais, animados e inanimados, materiais e imaterias”.

O Evangelho proposto pela liturgia para a nossa reflexão no dia de hoje nos traz Jesus diante de uma situação inusitada. Ele está em território pagão, na região da Decápole, as dez cidades na fronteira oriental do Império Romano na Judeia e Síria. Um surdo-mudo foi apresentado a Ele por algumas pessoas. Elas puderam presenciar um grande sinal (milagre): “Jesus afastou-se com o homem, para fora da multidão; em seguida, colocou os dedos nos seus ouvidos, cuspiu e com a saliva tocou a língua dele. Olhando para o céu, suspirou e disse: Efatá!, que quer dizer: Abre-te! Imediatamente seus ouvidos se abriram, sua língua se soltou e ele começou a falar sem dificuldade” (Mc 7, 33-35). Trata-se de um dos sinais realizados por Jesus que vai muito além de uma simples cura física daquela pobre pessoa.

A criação de Deus se rejubila com a ação de Jesus no meio dela. Podemos dizer que a missão do Mestre Galileu inicia uma nova criação. A primeira criação já se manifestara na ação do Criador, como nos fora dito pelo Livro do Gênesis: “E Deus viu tudo o que havia feito, e tudo era muito bom. Houve uma tarde e uma manhã. Foi o sexto dia”. (Gn 1,31). A narrativa da criação não como um tratado científico, mas como um poema que contempla o universo como criatura de Deus. Jesus dando continuidade a Palavra e promessa de Deus. Nesse sentido, Ele abre os ouvidos e a boca das pessoas, para que elas mesmas sejam capazes de ouvir e falar, isto é, discernir a realidade e dizer a palavra que a transforma e liberta. A ação de Jesus transformando pessoas e fazendo delas instrumentos da transformação do mundo. Os sinais do Reino acontecendo na medida em que estas pessoas vão abraçando a causa com Ele.

“Abri-nos, ó Senhor, o coração, para ouvirmos a palavra de Jesus!” (At 16,14b) Os nossos sentidos, todos eles, estão aptos a captar aquilo a que se propõe como obras do Criador. Todavia, ainda estamos por demais fechados no nosso egoismo e não nos abrimos aos anseios de Deus que calam dentro de nós. Somente em Jesus a mudez e a surdez interiores do nosso coração são definitivamente vencidas, e somente n’Ele a pobreza maior da pessoa humana, a solidão, aquela de quem vive afastado e longe de Deus, que é amor que se doa e cuida, é definitivamente vencida. Que nos deixemos ser vencidos pela força revolucionária do amor que transforma as nossas estruturas pessoais em atos de doação e serviço às causas do Reino. Cura a nossa Cegueira, Senhor! Abre também os nossos ouvidos e solta a nossa língua para que pronunciemos palavras sábias de transformação deste mundo!


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.