Unidade na diversidade

Quinta feira da sétima semana do tempo pascal. Estamos chegando ao final de mais uma etapa, em que fomos convocados a rezar pela unidade entre nós cristãos. O grande desafio que nos foi proposto é o de fazer unidade na diversidade. Tarefa nada fácil, num contexto em que cada um se empenha em querer fazer valer apenas aquilo que pensa e acredita como verdade absoluta. Somos filhos de um único Deus, muito embora com crenças diversificadas, valores e princípios nas formas de reverenciar este Deus. “Para que todos sejam um como tu, Pai, estás em mim e eu em ti”. (Jo 17,21) Este é o grande chamado que nos é feito, como forma de construir outro mundo possível. É na diversidade das cores que faz brotar a beleza e encantamento do arco-íris.

Rezei nesta manhã acompanhado das dezenas de enormes araras azuis, fazendo festa em meu quintal, degustando alegremente os frutos saborosos de buriti. Uma algazarra total de frases desconexas, mas de plena comunicação entre elas. A natureza se complementando e mostrando a sua razão de ser unidade na sustentabilidade da vida. Diante da cena litúrgica festiva que presenciei nesta manhã, como entender a lógica perversa daqueles que defendem a ideia de que a “floresta de pé” impede o desenvolvimento? Se a floresta não está de pé, significa que ela é folha morta e, consequentemente todos nós, que dela dependemos para a nossa sobrevivência.

Estamos há alguns poucos passos da grande festa da cristandade: Pentecostes. O mistério das Três Pessoas ecumenicamente encontrando-se em uma só, formando uma unidade perfeita. Nenhuma delas se anulando em função da outra, mas afirmando e se complementando em forma de unicidade. Pai, Filho e Espírito Santo, se fazendo mistério, preenchendo a nossa existência na amorosidade de um Deus que é Pai e Mãe de todos nós, na ternura da extrema compaixão. A diversidade se fazendo unidade conjunta, presenteando-nos como seres de luzes e beleza, que a feminista Eli Odara sintetizou assim numa de suas frases: “A beleza tem cor da diversidade, tem movimento no sentido da liberdade, tem esperança brilhando na busca da igualdade. O nosso ser imagem e semelhança de Deus, ganhando forma concreta no encontro de amorosidade entre Pai, Filho e Espírito.

Segundo a proposta litúrgica para esta quinta feira, Jesus está concluindo o seu assim chamado “discurso de despedida”. Como se proferisse uma “oração sacerdotal”, Ele reforça ainda mais a sua condição de unidade com o Pai, manifestando a sua preocupação com os seus seguidores, que terão a tarefa de “continuar no mundo”, exercendo a missão de ser extensão de sua proposta. Jesus é o mistério “indizível”, que não dá para traduzir em palavras, em discursos teológicos. Nesta compreensão, Jesus, é o Verbo (Palavra de Deus). Ele é a luz que brilha nas trevas e ilumina a consciência de todo ser humano. Luz esta que nos conduzirá ao Deus que é amor e fidelidade. Um Deus que é fiel ao que prometeu. Ou seja, através de Jesus, Deus conduzirá a humanidade para onde ela jamais teria pensado: partilhar a própria vida e felicidade de Deus. É para esta finalidade que a Palavra se fez pessoa humana e veio estabelecer a sua morada neste mundo.

Jesus concluindo a sua passagem entre nós. Depois de realizar a sua missão ao encarnar-se na realidade humana, Ele se prepara para o reencontro com o Pai. Se para o povo israelita do Antigo Testamento, Deus se manifestara de forma “filosófica”: “Eu Sou aquele que Sou”. (Ex 3,14), com a Encarnação do Verbo, Deus se faz plenamente humano na pessoa de Jesus. Um Deus presente na história de humanidade em carne e osso. Jesus, o Deus Filho, o verdadeiro e total Dom do Pai, é o único que pode falar de Deus Pai, porque comunica o amor e a fidelidade do Deus que dá a vida às pessoas. Numa profunda intimidade com Deus, Jesus se revela a Imagem do Pai, e o Pai se vê totalmente no Filho, ambos num eterno diálogo e mútua comunicação presencial.

Nesta sua oração Jesus demonstra profunda intimidade sincrônica entre Ele e Deus. Mediante tal intimidade, sabemos que a humanidade já não está mais condenada a caminhar às cegas. “Pai santo, eu não te rogo somente por eles, mas também por aqueles que vão crer em mim pela sua palavra”. (Jo 17,20) Ao nos fazermos unidade no amor com a caminhada de Jesus, testemunhando o seu ser ressuscitado, vamos construindo entre nós o sonho do Reino de Deus. Que tenhamos esta mesma intimidade, senão com Deus Pai, pelo menos na pessoa do Deus Filho, que se fez um de nós! Que venha Pentecostes e renove as nossas vidas pela luz do entendimento de que fazemos parte da grande família! Somos filhos da luz. Somos testemunhas do Ressuscitado.


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.